Edson Rontani Júnior, jornalista, membro do IHGP e da Academia Piracicabana de Letras
A
memória é única. Olho para cima e cumprimento um jovem com feições quase
orientais. “Este é o Maurício, o criador da Mônica”, disse alguém ao me
apresentar a Maurício de Souza, na primeira metade dos anos 1970. Não dá para
forçar muito a memória, pois tinha eu lá pelos meus seis ... sete anos de vida,
e o criador da dentuça dos quadrinhos viera de São Paulo visitar meu pai. Ambos
trocavam telefonemas e correspondências, como um cortejar pelos traços do velho
Edson Rontani. As cartas trocadas foram muitas. Todas catalogadas e guardadas a
sete chaves. As assinaturas de Maurício são verdadeiras obras de arte.
Maurício
de Souza veio a Piracicaba por diversas vezes. Estava criando uma produtora
própria associada à Editora Abril de Victor Civita, depois de atuar alguns anos
na imprensa, em especial na Folha de São Paulo. Uma das visitas era para
convidar o velho Rontani a compor sua equipe. Convite recusado. Mesmo caminho
tomado anos antes quando, no Rio de Janeiro, fora cotado para ocupar uma
cadeira na EBAL – Editora Brasil América Ltda., de Adolfo Aizen, a qual
publicava os medalhões que hoje pertencem a Marvel e DC Comics, anteriormente
distribuídas pelos Syndicates em todo o mundo. Rontani recusou trocar a “Noiva
da Colina” pela “Cidade Maravilhosa”, mas deixou um legado de capas (publicadas
ou não) com Namor, Spirit, Batman, Superman e outros.
Maurício,
Civita, Aizen, Rontani e tantos outros não devem ser esquecidos no Dia Nacional
dos Quadrinhos, lembrado esta semana (30 de janeiro), assim como outros grandes
expoentes como Ivan Saidenberg, que povoou o imaginário dos quadrinhos, este,
porém, na franquia Disney, com seus derivações do Peninha: Peninha Kid, Morcego
Vermelho, Pena da Selva, além dos clássicos Mickey, Pato Donald, Pateta e Zé
Carioca. Saidenberg nasceu em Piracicaba e faleceu em Santos, atuando no auge
dos quadrinhos nacionais (anos 1960) nas editoras Outubro, Taika, Penteado e La
Selva, as quais publicaram obras-primas, cujas edições hoje valem peso de ouro.
O
dia nacional dos quadrinhos foi criado para homenagear desbravadores que
enfrentam as mídias digitais de uma forma brava e constante. Claro que
Piracicaba foi celeiro para muitos desenhistas (Lancast, os irmãos San Juan,
Spadotto, Hussar, Edu Grosso, Longo, Douglas Mayer, e muitos outros resgatados
por Adolpho Queiroz nas duas edições de “Piracartum”). Tem um salão
internacional que premia aqueles que se dedicam às tiras, de onde vieram os
principais personagens dos quadrinhos e do cinema.
“Para
ler pato Donald” foi um dos primeiros itens teóricos a criar o negacionismo nas
HQs. Todo mundo ria com Mickey. Todos riam com Pica-Pau. Mas, houve filósofos
que viam nas gags apresentadas uma mensagem subliminar para dominar o coletivo.
Ué ... As mídias digitais não ditam estas regras atualmente ?!? A obra
questionava a democratização da liberdade. Algo para se reler, rever e repensar,
numa época em que antigos pensamentos se atualizam, como Dale Carnegie que
ainda aparece entre os mais vendidos com seu “Como fazer amigos e influenciar
pessoas” escrito há 86 anos atrás.
Já
Marcelo Maiolo e Rafael de Latorre são artistas renomados internacionalmente.
Dedicaram muito à DC e à Marvel, com obras publicadas nos EUA, África do Sul e
outros países. Trabalham à distância. Facilidade que não tínhamos quando
Maurício de Souza veio a Piracicaba nos anos 1970, obrigando o presencial e
impedindo o celeiro de criadores crescer. E viva Angelo Agostini, homenageado
por este dia nacional dos quadrinhos !
(Artigo publicado no "Jornal de Piracicaba" de 02 de fevereiro de 2022 e na "Tribuna Piracicabana" de 04 de fevereiro de 2022)
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