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domingo, 12 de fevereiro de 2023

E o Titanic submergiu ...

Edson Rontani Júnior, jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba

Li estes dias que “Titanic”, o filme de 1997, retorna às telas esta semana. É a terceira maior bilheteria do cinema, que junto a “Avatar” (2009) e “Avatar – O Caminho das águas” (2022) dão o título a James Cameron como o cineasta que fez três dos quatro filmes mais assistidos e rentáveis de toda a história.

Isso me trouxe à memória as exibições que tivemos em Piracicaba deste filme que, por trás de um romance meloso, mostrava o grande desastre do transatlântico naufragado em 15 de abril de 1912. Quando lançado 25 anos atrás, “Titanic” foi exibido nas salas do Cine Center, no Shopping Piracicaba, coordenado pelo Grupo Paris Filmes. Era de ver o brilho nos olhos de Márcio Fraccaroli, CEO do Grupo Paris, e do “seu” Silvio, gerente das salas, a rotatividade de pessoas que comprava ingressos para apreciar a obra na telona. Cabe ressaltar que nesta época, houve uma debandada muito grande do público diante das salas exibidoras motivada pelo VHS. A fita de vídeo-cassete era a vilã por trás de tudo. Mas, nas semanas em que o longa ficou em exibição, as salas lotaram. Ainda não havia cobrança de estacionamento neste centro de compras.

Meses depois, “Titanic” foi exibido por semanas a fio na Sala Grande Otelo do Cine Arte, no complexo do Teatro Municipal Dr. Losso Netto. Era algo comum na ocasião. Reprises por semanas. Me recordo que, por força do ofício – eu era cinéfilo e comentava sobre cinema num jornal local e numa emissora de rádio –, “Dirty Dancin’ – Ritmo Quente” (1987) ficou em cartaz por oito semanas na Sala Grande Otelo.

Toda esta rememoração nos traz a nostalgia das salas exibidoras da cidade. A rua Benjamin Constant possuía três cinemas, de responsabilidade de Francisco Andia, que nos anos 1960 tinha sua produtora a Águia Filmes. O primeiro era o Cine Colonial. O segundo era o Cine Rivoli, com quase 1 mil assentos, e o último era o Cine Paulistinha, na altura da Paulicéia. Tivemos também o Cine Politeama e o Cine Brodway nas proximidades da praça José Bonifácio. Eles tiveram outras denominações ao longo do tempo, assim como tivemos outros cinemas na cidade. Um deles, nos anos 1920, situava-se na rua Governador Pedro de Toledo, onde foi a Fábrica de Balas Petrin, hoje, filial de um supermercado. Assim, vamos nos ater aos cinemas existentes nos anos 1980 e 1990.

Aliás, pouco antes, entre as décadas de 1970 e 1980, era comum a fila “dobrar a esquina” – ou as esquinas – no Rivoli. Filmes de Mazzaropi e Os Trapalhões faziam a fila iniciar-se na Benjamin, virar a XV de Novembro e finalizar na avenida Armando de Salles Oliveira, bem em frente a saída de emergência do Rivoli. Foi assim, com “King Kong” (1976), “De Volta para o Futuro” (1984), “O Segredo do Abismo” (1989) – olha James Cameron de novo – e tantos outros. Recordo-me que ao assistir “Os Trapalhões no Planeta dos Macacos” (1976) as únicas cadeiras vagas eram aquelas da primeira fileira, nos obrigando a uma ginástica com o pescoço e os olhos para acompanhar o andamento das cenas na telona. Bendito seja quem implantou a venda de cadeiras enumeradas no cinema a exemplo do que ocorre nos ônibus e aviões !

Cabe ressaltar que o Cine Arte tinha este nome por ser uma espécie de cinemateca. Era uma sala pequena. Duas, se não me falha a memória. Foi lá que assisti às reprises dos filmes “O Jovem Frankenstein” (1974) de Mel Brooks, “Metrópolis” (1984) de Fritz Lang restaurado por Giorio Moroder e obras de Alfred Hitchcok, liberadas por sua viúva após mais de 30 anos sem circulação.

O Grande Otelo fechou suas portas não ao acaso. Situava-se no Teatro Losso Neto, na rua Santa Cruz. Local de alagamentos quando chove. Alguns devem se lembrar do Pronto Socorro Central, ali próximo, desativado por conta das inundações. Certa noite, em 1998 ou 99, numa reprise de “Titanic” o público sente os pés molharem ... Não era efeito ... Era a água do toró que caia lá fora adentando no recinto. A inundação chegou a altura dos assentos, obrigando muita gente a sair pelas janelas do banheiro. Que naufrágio ...

(Publicado no Jornal de Piracicaba de 08 de fevereiro de 2023)