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sábado, 11 de janeiro de 2025

Com o fogo fez-se a luz

Edson Rontani Júnior, jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba 

Curioso é debruçar-se diante de livros sobre Piracicaba e ver que sua história é repetida por diversos autores. Estes bebem da mesma fonte que ajudaram a propagar a história local. Debruçaram sobre atas da Câmara Municipal, sobre os tradicionais almanaques e principalmente sobre os jornais impressos, entre outros documentos.

Existem outras fontes, distantes, na ocasião, para tais pesquisadores. Leandro Guerrini chega a citar documentos em posse de Portugal sobre a distribuição de sesmarias e povoação daquilo que séculos atrás foi o embrião de Piracicaba. Existem, claro, documentos além destes, alguns acessíveis hoje com facilidade pela rede mundial de comunicação, a internet. Mas a história ainda está restrita ao papel e aos poucos vem sem digitada, digitalizada ou lida pelo sistema OCR dos scaners.

Nada disso tira o mérito do estudo de muita gente que, por exemplo, nos permite falar, pela segunda semana, sobre a iluminação na cidade. Dias atrás, caminhando em frente a Igreja do Frades um caminhão baú passa e leva consigo uma fiação caída do poste. A parte que ele deixou esticou-se e voltou como se fosse uma estilingada. Dos postes vemos um emaranhado de fios soltos que colocam em risco os pedestres, ciclistas, motociclistas e motoristas.

Os postes “raízes” de Piracicaba vieram de doação da capital do Estado. Funcionavam à querosene por cerca de quatro horas. O passado chega a ser curioso e engraçado. Havia uma pessoa (funcionário da Câmara) que com uma vareta colocava fogo e acendia o lampião. Assim, como em terras britânicas, durante a Revolução Industrial, havia o profissional que passava de casa em casa jogando pedregulhos nas vidraças para acordar os trabalhadores para mais um dia de labuta. Isso antes do despertador existir. Bom, claro que já havia galo. Mas aí a história é outra. São profissões que caíram em desuso e se extinguiram. É o caso do “guarda livro”, antiga denominação dos contadores e contabilistas que anotavam o movimento financeiro das empresas em grandes livros, tudo escrito à mão.

Dona Mariinha, Maria Celestina Teixeira Mendes Torres, filha de Otávio Teixeira Mendes, descreve Piracicaba no século 18 com sendo uma cidade sem tecnologia, desenvolvimento e infraestrutura, sendo que “só tomará alento na década dos anos 70”. Dona Mariinha fala que o surgimento da energia e, por conseguinte, a luz, Piracicaba passa a vislumbrar seu futuro. Vendas e tavernas, até 1873, tinham iluminação noturna precária: lanterna presa a um gancho na parede – a querosene ou qualquer outro combustível comum na época. De lampiões ao poste foi um tremendo pulo tecnológico. As pessoas podiam sair à noite ! Podia-se enxergar no escuro. De forma precária, claro.

Depois fomos do lampião para a luz elétrica em poste, Piracicaba passa a ver uma realidade de outro mundo. A iniciativa foi de Luiz de Queiroz, muito tempo antes da doação de sua fazenda para que nela fosse instalada a Escola Agrícola Prática. A inauguração da luz elétrica se deu em 6 de setembro de 1893. Tornou-se fato após assinatura de contrato entre sua empresa e a edilidade. Nos primeiros dias pouco mais de metade das 235 lâmpadas prometidas acabaram acesas. A Gazeta de Piracicaba de 7 de setembro daquele ano garantia que não havia oscilação nas lâmpadas de 32 watts devido a um grande motor hidráulico bancado por Queiróz.

A luz elétrica era novidade. Saímos da iluminação feita pelo fogo e chegamos ao filamento que brilhava com uma bruta incandescência. Era comum sair de casa e ficar vislumbrando os postes. Não falei que ao ver o passado podemos deparar com situações curiosas e engraçadas ? Tamanha era a novidade que bandas (duas) tocaram à frente do Hotel Central, na praça José Bonifácio, onde Queiroz se hospedava. A população saiu às ruas para enaltecer a ação do homem visionário. Meses depois, em 6 de janeiro de 1894, Luiz de Queiroz pede para que a Câmara de Vereadores seja fiadora de um empréstimo altíssimo para que pudesse completar a instalação de sua empresa de iluminação. Tal pedido seria feito junto ao Banco da República do Brasil. Ilustre inovador já estava em delicada crise financeira. De lá para cá, a chama da luz nunca se apagou.

(Publicado na Tribuna Piracicabana edição de 11 de janeiro de 2025)

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