Ilmo. Sr.
Jornalista EDSON RONTANI JÚNIOR
PIRACICABA
Prezado Sr. Edson,
Agradecendo
sua gentileza de me mandar seu trabalho “Reinações de Monteiro Lobato em
Araquá”, tomo a liberdade de fazer os seguintes comentários:
1.) Monteiro Lobato
pesquisou petróleo na divisa norte do município de São Pedro, perto de
Charqueada (ou Xarqueada), e não onde hoje existe Águas de São Pedro; a fazenda
de Ângelo Franzim era uma pequena parte da área da atual Estância, que
compreende também diversas outras propriedades compradas por meu Pai para a
implantação dessa nova cidade;
2.) onde hoje existe
Águas de São Pedro, antigo bairro do Querozene no município de São Pedro, as
pesquisas foram feitas pelo Serviço Geológico da Secretaria de Agricultura do
Governo do Estado de São Paulo – governador Júlio Prestes e secretário da
Agricultura Dr. Fernando Costa – e pela iniciativa privada representada pelo
italiano Ângelo Ballone (que perfurou os poços Balone I e Balone II, este que
atingiu 1.615 metros de profundidade, sem encontrar petróleo – é onde ainda
hoje existe a torre de perfuração aqui em Águas de São Pedro);
3.) assim, creio que os poços “Querozene”, “Franzim”,
“Giocondo”, “Tuncum” e “Graminha” não foram perfurados pelo Monteiro Lobato,
pois, como disse acima, ele não perfurou nas proximidades do local onde hoje
(desde 1.940) existe Águas de São Pedro;
4.) As águas minerais
jorram dos poços identificados e registrados pelos nºs 22 (água Almeida Salles), 55
(fonte Juventude – água sulfurosa) e 112
(fonte Gioconda); cada uma dessas águas tem características químicas próprias,
sendo que somente a água da Fonte Juventude é que contém enxofre; nas outras, o
elemento químico preponderante é o bicarbonato
de sódio (Fonte Almeida Salles) e sulfato
de sódio (Fonte Gioconda);
5.) Águas de São Pedro
começou a ser planejada em
1.935, depois que meu pai, Octavio Moura Andrade, constituiu a empresa “Águas
Sulfídricas e Termais de São Pedro S/A” para construir a estância; a primeira
providência foi fazer analise das três águas minerais – cuja composição química
era desconhecia até então – pelo IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas
(hoje USP), na época anexo da Escola Politécnica, cujos resultados finais, pela
abrangência e seriedade das análises, foram publicados em outubro de 1.940
(Boletim nº 26 do IPT);
6.) entretanto,
confiando na alta mineralização das águas, iniciou a compra da área necessária
para a implantação da nova cidade – tendo comprado 650 alqueires ou 1.600
hectares – reunindo em uma única propriedade as três fontes de água mineral
existentes no município de São Pedro – e contratou o engenheiro urbanista Jorge
de Macedo Vieira para projetar uma nova cidade, voltada exclusivamente para o turismo
da saúde; o saneamento da Estância foi confiado ao Escritório Técnico Saturnino
de Brito, do Rio de Janeiro;
7.) além de implantar a
infra-estrutura urbana da nova cidade – ruas, sistema de água potável (desde a
represa de captação, estação de recalque, linhas de adução, estação de
tratamento de água, reservatório com capacidade de 600.000 litros de água
tratada para a cidade por existir ainda), rede de esgoto sanitário, redes
elétricas, reflorestamento, parques, jardins, canais de saneamento, galerias de
águas pluviais, enfim, toda a estrutura que uma cidade de cura e laser exige
para atender ao mais exigente hóspede - meu pai inaugurou, a 25 de julho de
1.940, o Grande Hotel São Pedro, hoje escola do Senac; por isso é que 25 de
julho de 1.940 é a data da fundação de Águas de São Pedro, pois tudo o que
havia antes (entre 1.936 e 1.940) era apenas os preparativos (ou canteiro de
obras) para a nova estância paulista; e, anteriormente, apenas algumas fazendas
decadentes, pela derrocada do café;
8.) evidentemente a
parte médica foi o grande foco da obra; assim, com os primeiros resultados
fornecidos pelo IPT, já em 1.936, meu pai submete à apreciação do Prof. Dr.
João de Aguiar Pupo, então Diretor da Faculdade de Medicina de São Paulo (hoje
USP), dermatologista de renome internacional, que elabora minucioso programa e
indicações de uso das três águas minerais aqui existentes, cada uma com
característica própria;
9.) os primeiros poços
de pesquisa de petróleo, até onde eu tenho notícias – é interessante visitar o
Museu de Geologia que existe (ou existia) no Parque Fernando Costa (Água
Branca) em São Paulo – foram abertos em 1.892 (+) no município de
Bofete; no município de São Pedro, até onde eu tenho documentos, as pesquisas
foram feitas no início da década de 20 de século passado (+ 1.921 a
1.926);
10) meu Pai contava que,
quando iniciou as obras da construção da estância e do Grande Hotel (em 1.937 /
1.938) Ângelo Balone estava muito doente e com sua estrutura semi-paralizada,
não dispondo mais de capital para continuar as perfurações; já havia atingido a
maior profundidade da época, 1.615 metros, e encontrado apenas pequeníssimas
manchas de óleo, nada que denunciasse possibilidade comercial;
11) não tenho notícia ou
registro dessa visita dos acionistas da Companhia Petróleo Nacional a São
Pedro, em 1.933; meu Pai, advogado e exportador de café, morador em Santos,
veio a São Pedro pela primeira vez em 1.934 e nunca se referiu a essa visita,
que pelos números de seu trabalho teria sido muito importante para a cidade de
São Pedro; igualmente me parece que o trem da Sorocabana, que levava 2 horas e
45 minutos para ligar Piracicaba a São Pedro não dispunha de acomodação para
tantos passageiros; por isso, sugiro que confirme bem essa informação e se na
realidade a visita não foi feita via Rio Claro – trem da Cia. Paulista de
Estrada de Ferro – e o objetivo da visita tenha sido Charqueada;
12) a fama de Águas de
São Pedro é decorrente não do período da pesquisa de petróleo mas sim da grande
divulgação das virtudes terapêuticas das nossas água minerais, feitas por meu
Pai a partir da inauguração do Grande Hotel (1.940), bem como pela excelência
das acomodações e tratamento hoteleiro oferecidos tanto por este hotel como
pelos demais – Avenida e Santo Antonio, também construídos por ele – e a
qualidade dos serviços de infra-estrutura urbana (água, esgoto, luz,
saneamento, projeto urbanístico, etc.), que acabaram com fazer de Águas de São
Pedro a cidade brasileira com melhor IDH – Índice de Desenvolvimento Humano do Brasil,
segundo pesquisa patrocinada pela ONU;
13) lamento contrariar
seu escrito; entretanto tenho aqui o livro “Boletim nº 22 – Petroleum Geology
of the State of São Paulo, Brasil”, editado em 1.930, organizado por Chester W.
Washburne, “with a geological map of the
State of S. Paulo, by Commissão Geographica e Geológica do Estado de São Paulo”,
inclusive com mapa mostrado os poços feitos no município de São Pedro, com a
precisa indicação da Fazenda Franzim, o que me dá muita segurança para afirmar
que Monteiro Lobato não
perfurou onde hoje existe Águas de São Pedro. E que as obras e demais ações de
meu Pai, Octavio Moura Andrade, na concepção, fundação e desenvolvimento da
Estância, deixa claro que Águas de São Pedro existe e é conhecida a partir
dessa sua atividade no sentido de transformar um elemento existente na natureza
– águas minerais desconhecidas num local inóspito – em produto acessível e
confiável como elemento de recuperação de saúde, em local dotado de moderna
infra-estrutura hoteleira e urbana;
14) como uma última
observação: as sondas mais antigas, marca/modêlo “Keystone 45”, como a que
existe até hoje aqui em Águas de São Pedro, eram de percussão, não rotativas, o
que limitava muito sua eficácia, sendo que, segundo tenho notícia, a capacidade
de perfuração era ao redor de 400 a 500 metros de profundidade; daí os
primeiros poços dificilmente irem além dessa profundidade; Ângelo Ballone
conseguiu adaptar a sonda que usava e chegar aos 1.615 metros, verdadeiro
recorde na época.
Estou
à sua disposição para qualquer outro esclarecimento e para mostrar estes e
outros elementos que disponho sobre o assunto. Entretanto, devemos fazer
justiça histórica aos pioneiros, como Ângelo Ballone – engenheiro italiano que
perdeu sua saúde e fortuna aqui em São Pedro em busca do sonho de achar o “ouro
negro” – e brasileiros ou não, como os engenheiros Eugênio Bourdot Dutra,
Gerson de Faria Alvim, Chester W. Washburne e outros que foram também pioneiros
nesse sonho.
Cordialmente,
Antonio F. de Moura Andrade
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