Edson Rontani Júnior, jornalista
Estamos
ainda no período de confinamento, nos escondendo e nos protegendo contra o
corona vírus. Para alguns, é uma proteção que garante a vida. Para outros, é um
período enfadonho. Para mais alguns, é um período produtivo em que você tem
mais tempo para si, para curtir a família, ficar em casa, sair da rotina. Mas traz
saudade, sim. Principalmente de ver os parentes, de participar daquela
comemoração, de ir ao shopping sem destino algum, ou de ter uma vida social que
nos “obriga” com o maior prazer a participar de churrascos, ir a piscina ou
mesmo uma roda de amigos num barzinho qualquer.
Mas,
foi a busca pelo confinamento que me fez dedilhar estas linhas. A história não
é de hoje, mas pode ser atual.
Estamos
à beira de uma guerra nuclear. A história envolve um bancário que adora ler. Lê
no café da manhã, lê durante o trabalho, lê no momento da folga ... Tem paixão
em conhecer aquilo que a sabedoria humana transformou em palavras impressas.
Seleciona os principais pensadores e debulha-se sobre as pequenas letras. Num
certo dia, o bancário decide ler um livro no cofre do banco em que trabalha, o local
mais tranquilo que ele encontrou. Lá dentro, ele sente uma explosão – estamos à
beira de uma guerra nuclear, lembra? Ao sair, nota que nada mais existe além de
escombros. Foi a hecatombe.
Feliz
da vida, não se roga pela perda dos amigos. Não se abala. Fica contente pois
tem “tempo suficiente” para ler todos os livros que quiser, sem ser incomodado,
já que todos foram dizimados. Corre para a Biblioteca Pública – ela permaneceu
em pé ! – e passa a selecionar os livros para amanhã, os livros para depois de
amanhã, para a semana que vem ... e assim por diante.
“Ploft!”
... Sem querer, o bancário que era extremamente míope, pisa em seus óculos tipo
“fundo de garrafa” quebrando-o. Não enxergava um palmo à frente sem eles ...
“Tempo suficiente para o que, agora?”, diz.
A
história é um conto escrito em 1953 por Lynn Venable, adaptada por Rod Serling
em 1959 para o seriado televisivo “Além da Imaginação”. O bancário era vivido
por Burgess Meredith que uma década depois tornou-se o Pinguim no seriado
“Batman” e duas décadas depois foi o treinador de Sylvester Stallone em “Rocky”
(o primeiro). O episódio se chama “Tempo Suficiente”.
Na
época, a televisão tornava-se um dos mais ágeis meios de comunicação. Adentrava
aos lares, e competia diretamente com o cinema. O cinema exigia um certo ritual
para ser consumido (roupa, horário, transporte, guloseima e ... ingresso!). A
televisão chegava de graça. Com a “Guerra Fria” era esperada uma aniquilação
imediata da raça humana. Muitas residências americanas possuíam bunkers
subterrâneos esperando um ataque nuclear russo.
Mas
isso não vem ao caso. Nosso personagem buscava o confinamento para fazer o que
mais gostava: ler e aguçar sua imaginação. Hoje, a imaginação está na ponta dos
dedos, no smartphone, na smartv ou no computador. Dar uma cutucada na
imaginação retomou a preguiça já que tudo está aí, com fácil acesso.
O
confinamento e o distanciamento social proporcionado na atualidade deixaria o
personagem do episódio numa situação que ele almejava: preso em casa lendo os
livros que quisesse.
Sempre
é bom lembrar que como países abaixo dos trópicos, onde o calor marca presença
inclusive nesse início de inverno, o brasileiro torna-se inquieto e não arreda
o pé de ir a rua. Não há por que ficar em casa. Me lembro de uma conversa que
tive com Alceu de Marozzi Righetto, secretário municipal da Ação Cultural, há
uns 30 anos atrás: europeu e asiático se confinam involuntariamente em casa
pois na maioria dos meses a temperatura chega próxima ou abaixo dos 10 graus
negativos. Não há por que sair. Tem-se de ficar em casa e esperar a próxima
onda de sol. No confinamento surgiram os grandes pensadores universais,
intelectuais de renome, expoentes do pensamento universal. No Brasil, confinamento
é chato e “bater perna” não trouxe nenhum Nobel para nós.
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