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terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Cinquentenário da fita cassete



 
* por Edson Rontani Júnior, jornalista

   Confesso que esperava a mesada semanal de meu pai para comprar minhas fitas cassetes. Isso nos, hoje, longínquos anos 80. Era pouco, mas sempre bem vindo para um pré-adolescente que ainda não trabalhava. Talvez fossem sete ou dez cruzeiros toda semana. E com o dinheiro ia próximo a praça José Bonifácio, na Budasom, comprar uma ou duas fitas Basf. Normalmente eram as de 60 minutos, pois as de 90 minutos (com maior capacidade de gravação) eram mais caras. As fitas de cromo, então, eram inatingíveis objetos de consumo, de tão caras.
   Sem medo de ser nostálgico, a fita cassete me impulsionou a ter paixão pela música. Isso no início dos anos 80. Gostava tanto de ouvir as FMs da região (na verdade, só existiam a Andorinhas de Campinas e a Difusora de Piracicaba) que passava a maior parte de meu dia – era estudante – ouvindo e decorando as músicas. Isso me fez trabalhar em duas emissoras de rádio ao longo de 15 anos.
  Com uma fita cassete eu poderia eternizar aquele momento, aquela música, aquele estilo de FM conhecido como “música de elevador”, no qual as emissoras apresentavam apenas a hora certa, poucos comerciais e muitas músicas. Nos anos 80, você tinha acesso ao LP, tape de rolo (caro demais) ou então a fita cassete. Era moda passar o long-play para o cassete e assim poder levar a música para você quisesse.
   Lembro-me que sair na rua com um tape (toca-fitas), de braço dado com a namorada, era um invejado status. Algo similar a hoje ter um smartphone ou um carro de padrão médio. Você era medido pelas marcas Fiorucci (jeans), Pool (camiseta), All Star (tênis) e o Tojo (equalizador do tape). Parece engraçado, mas eram assim os anos 80.
   E, nada mais que nostálgico, a fita cassete está completando seu cinquentenário! Ela é o avô dos iPads atuais. Funcionava de forma analógica e tinha a caneta Bic como sua melhor amiga, para que fosse rebobinada.
   A fita cassete ou K-7 foi chegou aos 50 anos em setembro passado, desenvolvida pela Philips, através do engenheiro Lou Ottens. Foi o meio caseiro mais ágil criado pelo homem para se reter informações como entrevistas, músicas, gravações ... Os direitos autorais de reproduções vieram depois, lógico.
   Com o cassete, era possível levar qualquer gravação a qualquer lugar. Seja em gravadores de mesa, sistemas três em um, carro... Um passo importante veio com a Sony que criou o walkman, algo similar aos MP3s, porém analógicos.
   Lembro-me de ter ficado surpreso ao ler num jornal da capital que eu havia ganho o concurso de uma famosa marca de batata frita e como prêmio levei um walkman da Sony, de primeira geração. Este aparelho me acompanhou por anos. Me motivou ainda mais a ficar diante do aparelho de som para gravar as músicas que eu mais admirava.
   Quem viveu em Piracicaba os anos 70 e os anos 80 deve se lembrar. A Som 6, na Galeria Brasil, era o centro de encontro de quem gostasse de música. Vitrines, prateleiras, toca-discos, fones de ouvido... Imensa, ela tinha vários ambientes para você escolher a música e onde ouvi-la. E vivia lotada!
   O mundo digital surgiu. A gravação analógica passou a integrar museus. E com o avanço da tecnologia, a fita cassete perdeu seu glamour, ou como diriam, foi desmagnetizada.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Banalização fotográfica



Edson Rontani Júnior, jornalista

   Recentemente, numa sala de espera, uma pessoa manuseava seu smartphone fotografando algumas cenas que por nossa frente ocorriam. Na piscina de um clube, duas jovens abusaram dos selfies, de forma frenética, como se a câmara fosse um brinquedo de outrora.
   O mercado lançou smartphones de uma forma tão absurda que acabou criando o efeito da banalização fotográfica. Não que isso seja errado. Ter acesso aos avanços tecnológicos é uma situação inevitável e a popularização da fotografia nos remete à instantaneidade tão almejada pelo homem.
   Desde que lançada, a fotografia exigia habilidade, conhecimento, dinheiro e utilização de máquinas grandes e pesadas. Vale lembrar dos lambe-lambes e das máquinas fotográficas tipo “caixão” com lente reflexiva.


    A máquina fotográfica virou opção de “bolso” já nos anos 60, mas se popularizou nos anos 70 e 80 com as nostálgicas Instamatic da Kodak com flashes descartáveis que conseguiram iluminar quatro “poses”. Ainda nos anos 70, a instantaneidade veio com a máquina Polaroid. Fotografar e revelar na própria máquina era algo fantástico. Cabe lembrar que a fotografia antiga, ainda revelada em papel, demorava dias para que nos fosse entregue, uma vez que o negativo era levado à loja, passava por processos químicos, ampliado e depois devolvido. Até tempos atrás era possível assistir este processo das vitrines de uma loja do Shopping !

 
   A fotografia, desde sua criação, lá pelo longínquo ano de 1826, sempre foi um artigo de luxo. Era acessível a poucos. Sua popularização no Brasil veio pela família real através de Dom Pedro II (que aparece na foto acima, com a Princesa Isabel). Materiais para fotografar e revelar viajavam de navio, da Inglaterra ou da Alemanha. Foi Dom Pedro quem importou as primeiras máquinas e financiou a vinda de profissionais europeus como Marc Ferrez (abaixo, foto de sua autoria mostrando o Corcovado, no Rio de Janeiro) ou Louis Compte.

   A princípio, a ideia de preservar aquele instante para o futuro era algo mágico. Houve até quem dissesse que a fotografia roubaria a alma do fotografado. Sim. Falou-se até que aquilo era bruxaria.
   Antigamente, a foto era feita ao ar livre, para aproveitar a luz natural. Não era permitido mexer, pois qualquer movimento borraria o retratado. Daí a questão de aparecermos sérios nos documentos de identificação. Não há lei que nos proíba de ter uma foto sorrindo no RG, o que existe é um tabu criado pelo “olha o passarinho e não se mexa!”.
   Fato curioso são as “mães fantasmas”, encobertas por mantos escuros segurando filhos para não borrar a fotografia, já que eram necessários incansáveis segundos – ou até minutos – sem respirar.  


   Acima, exemplo de "mãe fantasma" : a mãe sentada, encoberta por tecidos que simulavam um móvel, segurando seu bebê. Veja outras fotos deste estilo clicando aqui

   Fotógrafos chegaram a ser coadjuvantes de luxo ao lado das debutantes e de jovens noivos. Os álbuns demoravam para serem ampliados e revelados, angustiando as famílias. Porém, um álbum sempre foi motivo para reunião familiar. Quanta gente não se reuniu ao redor de um deles para juntos ver as fotos, após a macarronada de domingo ? Este, aliás, é outro hábito que caiu em desuso.
   Piracicaba teve inúmeros profissionais que defenderam e defendem esta arte, entre os mais contemporâneos que já partiram Isolino Nascimento, Henrique Spavieri, Diógenes Banzatto, Lacorte, Cícero Correa dos Santos... Quantas lojas também nos ajudaram a manter a magia, com suas revelações ? Bischof, Budasom, Cantarelli, Iris Jetcolor, Outsubo...
   Se pegarmos fotos do século 19, notamos que um dos principais adereços dos “retratos” estava um livro, símbolo da sabedoria, ícone de que o retratado era de uma casta privilegiada, pois o ensino ainda não era obrigatório no país, ou seja, acessível a uma pequena minoria. Hoje a máxima pregada no Facebok : “um dos primeiros astronautas ao pisar na Lua tirou com muito custo sete fotos; adolescente foi ao banheiro do shopping e diante do espelho ... tirou 47 fotos fazendo biquinho !”. Não há bastão de selfie que nos salve !