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domingo, 13 de novembro de 2016

O dia em que conheci Marilyn Monroe

* Edson Rontani Júnior, jornalista e cinéfilo


Foi numa tarde fria de 1981 que conheci uma loira deslumbrante. Todo seu fascínio foi tomado por uma cena clássica : ao passar pelo respiradouro de uma estação de metrô, sua saia se levantava, com isso, elevando também a libido masculina de seu parceiro. A apresentação desta loira foi feita por um respeitado programador de cinema de nome Paulo Perdigão, o qual nunca conheci mas senti, como muitos, por sua morte em 2006.

Na verdade, Perdigão me apresentou Norma Jean mitificada pelo cinema como Marilyn Monroe, uma loira exuberante que se tornou um símbolo sexual nos anos 50. Foi através de uma das várias “Sessão da Tarde” que a conheci em “O Pecado Mora ao Lado” o qual ela estreou junto com Tom Ewell, um impagável comediante que infelizmente não conseguiu seu lugar no hall da fama. Foi um medíocre notável.


Essas mal tracejadas linhas foram escritas em memória daquilo que Paulo Perdigão criou nos anos 80, uma legião de fãs que hoje estão na casa dos 40 ou 50 anos e que ficaram à sua mercê numa época em que filmes só eram assistidos no cinema ou na televisão por antena convencional (nada de tv a cabo e muito menos parabólica). Isso criou pessoas frustradas, pois os filmes eram exaustivamente reprisados e muitas vezes jogados em horários ingratos. Ou eram a tarde ou no início da madrugada, para maldição daqueles que trabalhavam durante o dia.

Lembro-me que assisti muitos filmes sem saber sua conclusão. Eles começavam por volta da meia noite ou uma da madrugada, de forma que seu desfecho se daria lá pelas três horas da madrugada. Confesso que vi o fim de muitos filmes apenas com o advento do DVD. Foi algo que comecei nos anos 80 e só conclui nos últimos anos. Taí um dos motivos pela frustração que - eu e uma geração de cinéfilos - tivemos de Paulo Perdigão ...


A “Sessão da Tarde”, ainda hoje em exibição pela Rede Globo, foi um achado para muitos que nos anos 80 viam sucessos das décadas anteriores. Ela era o aposentar das produções hollywodianas. Aquele filme que passou em horário nobre quando inédito na tv e depois reprisado, quando chegava à “Sessão da Tarde”, era para ser devolvido à sua distribuidora. Não interessava mais ao público.

Foram anos promissores nos quais muitos viram clássicos do cinema como “Tarde Demais Para Esquecer”, “Melodia Imortal” ou “Férias de Amor”. Além de Marilyn Monroe, fomos apresentados a astros como William Holden, David Niven e a diretores com John Huston, Billy Wilder ou Douglas Sirk. Tinham ainda Jerry Lewis, Os Três Patetas e filmes em preto e branco. Isso só de repetiria em meados da década de 1990 na Fox ou na TNT, dois canais de sinal fechado.


A TVS, hoje SBT, foi mais generosa com os amantes do cinema. Aos domingos entre 21 e 22 horas apresentava clássicos não mais exibidos, a não ser pelo Telecine Cult. Foi lá que vi Lana Turner se desesperar em “Imitação de Vida” ou em “Madame X”, vi o careca Telly Savallas ser um sargento durão em “Beau Geste” (versão dos anos 60), Jerry Lewis em “Qual o Caminho para a Guerra”, ou assistir aos clássicos do horror como “Museu de Cera”, “Assassinatos na Rua Morgue”, entre outros. O ruim é que lembro de Perdigão – que me frustrou – mas nem sei quem era o programador da TVS – que tanto alimentou minha cultura cinematográfica.


Hoje durmo feliz, sonhando com Marilyn Monroe. Confesso que tive o privilégio de ser enfeitiçado pelo sexy appeal desta loira cinematográfica que grande maioria sequer se lembra. Mas confesso, sou feliz por ter vivido uma época na qual imperava na televisão o amor colegial, sem agressividade, sem tirania e o melhor, sem induzir o expectador à violência. Grato, Perdigão !


(Publicado no Jornal de Piracicaba de 11 de maio de 2022)