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sábado, 23 de setembro de 2023

Hotéis e concierges de Piracicaba

 Edson Rontani Júnior – jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba

 

Almeida Júnior, pintor que viveu do mecenato de Dom Pedro II, foi morto em frente a um hotel. Na região, o Grande Hotel de Águas de São Pedro funcionou como cassino. Dom Bertrand de Orléans e Bragança se hospedou no Hotel Beira-Rio em 2021. Estes são alguns fatos que nos remetem a hotéis da região de Piracicaba. Mesmo em época de hostess, moradas em containers e Airbnb, os hotéis ainda são sinônimos de luxo, não apenas em Piracicaba, mas mundo afora.

Isso tudo teve seu ponto de partida ao comentar dias destes com o amigo cirurgião-dentista Waldemar Romano sobre a arquitetura do Hotel Paulista. Uma foto que estampava o Teatro Santo Estêvão trazia à uma de suas laterais – onde se encontra hoje o Poupatempo Estadual – referida acomodação, numa arquitetura de dois pavimentos, com portas e varandas altíssimas, como aqueles casarões dos anos 1700 e 1800 que vemos em cidades com Tietê e Itú. Segundo Romano, ao lado deste, também sitou-se o Hotel do Lago, da família do compositor e ator Mário Lago, naquilo que era conhecido como o Largo do Teatro, na então praça 7 de Setembro (hoje, praça José Bonifácio). Não muito distante tivemos também o Hotel Central e décadas depois o Grande Hotel, próximo ao Mercado Municipal.


Estas rememorações surgem pois foram várias as contribuições destes hotéis para a cidade. Não apenas pela arquitetura de dois séculos atrás retidas apenas em pouquíssimas fotos como também para a vida social e a vida profissional da cidade. Um dos exemplos foi Aurora Conceição que por aqui clinicou como médica, formada pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, atendendo moléstias de senhoras e perturbações digestivas. Chegou a residir no Hotel Central de 1929 a 1931. Outra situação, desta vez de movimentação social: o Hotel do Lago, aliás, era ponto de partida dos troles que funcionavam com tração animal – atuavam como transporte coletivo na época – saindo pontualmente às cinco horas da manhã, isso em 1900.

A dimensão de alguns fica por conta da imaginação do leitor. Poderiam ter sido albergues, pensões, ou redutos de romeiros e retirantes. Samuel Pfromm Neto no seu “Dicionário de Piracicabanos” (Editora IHGP) lembra do “Hotel Europa”, situado na rua Governador, pertencente aos pais de Ida Schalch (o pai era engenheiro suíço e a mãe era alemã), uma das primeiras missionárias brasileiras educadas por metodistas.

Cartões postais nem tanto, mas os almanaques que povoaram Piracicaba no século passado traziam divulgações (textos e publicidades) de hotéis locais. Aliás, este era o papel dos almanaques, realizar a divulgação da cidade para o “estrangeiro nacional”.

Luciano Guidotti foi um cultuado “mestre de obras”. Criou a Pinacoteca, canalizou o Ribeirão do Itapeva, finalizou em seu segundo mandato o Estádio Barão da Serra Negra e tinha por intenção criar o Hotel Municipal. Este estava situado no parque ecológico de Luiz de Queiroz, pouco antes da Ponte dos Irmãos Rebouças, sentido Centro-Vila Rezende. O local também foi denominado de Parques Sachs em homenagem a André Sachs, onde, na segunda metade do século 1800, a sociedade piracicabana desfilava. Era o espaço onde ocorriam os piqueniques, apresentações de bandas em coreto edificado, e disputas de “partidas hamburguesas” ou boliche. O Hotel Municipal começou a ser erguido na década de 1960. Foi passado para iniciativa privada e arrematado anos atrás pela família que administra o Beira-Rio Palace Hotel.


Os hotéis locais também eram ponto de referência para a gastronomia. Anúncio em jornal de 1882 deixava claro que o Hotel Piracicabano, sr. Vicente Russo, disponibilizava a partir das 8 horas bifes a 400 réis com batatas ou ovos. Vicente comprou o hotel de Modesto Antonio Corrêa Lemos e este situava-se, lá por 1880, no Largo do Teatro. “O Piracicaba”, jornal da época o definiu como antigo e acreditado hotel, com cômodo e comida todas as horas e serventes para promover o giro do estabelecimento, além de veículos de tração animais para passeios, viagens e transporte para as estações da Paulista e Ituana.


Referência na cidade, o “Hotel dela Giardineira” situava-se onde próximo de encontra-se hoje a rede Oyo, rua XV de Novembro esquina com a Benjamin Constant. Era propriedade dos irmãos italianos – Paulo e Ricardo Pucci – e Archile Ghiara. Tinha quartos também para solteiros com gastronomia italiana. Para uma viagem ao tempo como esta, não se paga passagem ...

(Publicado no Jornal de Piracicaba de 20 de setembro de 2023)

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