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sábado, 11 de abril de 2020

Confinamentos



Edson Rontani Júnior, jornalista
   Aulas suspensas, ano letivo interrompido, comércio fechado. Tudo para enfrentar a pandemia. Eram dias quentes em Piracicaba naquela primavera de 1918. Um inimigo oculto afetava a cidade, trazendo a preocupação com o desconhecido. Não havia cura. Ainda era costumeira a existência de leprosários e sanatórios para confinar pessoas distantes da sociedade.
   - “Não há o que se fazer”, deve ter pensado alguém, ante à tão temida gripe espanhola que assolou o planeta naquele período, atingindo meio bilhão de pessoas.
   Piracicaba não ficou distante desta pandemia. Importada da Europa durante a Primeira Guerra, deixou a cidade de quarentena, matando 88 pessoas e atingindo outras 4.178, em especial as residentes no Porto João Alfredo (Ártemis) e outros bairros então considerados como zona rural. A cidade tinha perto de 30 mil habitantes. O prédio da Escola Sud Menucci virou hospital e internações eram feitas nas residências dos adoentados.
   A influenza espanhola cancelou partidas de futebol, fechou o comércio e confinou as pessoas em casa. A gripe atingiu os presidentes Venceslau Brás e Rodrigues Alves (que seria empossado e acabou falecendo em consequência dela). Na capital paulista, eram 5 mil novos casos por dia. Durante os três meses da pandemia, foram 5.500 mortos e 200 mil infectados.
   A história mostra ainda que outros confinamentos - voluntários ou não - existiram. Um foi o leprosário criado em 1885 por Manuel Farraz de Arruda Campos no bairro dos Alemães, popularmente chamado de “isolamento”. Os portadores do mal de Hansen eram segregados pela sociedade e se confinavam em casa. Quando adoecidos, eram recolhidos por Maneco Ferraz, inclusive escravos alforriados, para que não definhassem à míngua.
   Confinamento social também oferecia o Hospício dos Alienados criado pelo Barão de Serra Negra, funcionando a partir de 1º de janeiro de 1898, abrigando na Casa de Misericórdia os enfermos como local transitório até conseguirem vaga no hospital de Juquery. O local abrigava no máximo 10 “alienados”, cinco de cada sexo. Segundo seu administrador, dr. Torquato da Silva Leitão, através de relatos da época, chegou a atender 110 “enfermos, dos quais 55 nacionais e 55 estrangeiros, 46 homens e 64 mulheres”.
   Dentre outros locais de confinamento edificados em Piracicaba, estava o Sanatório São Luiz, criado sob a égide de Emílio Ribas, diretor do serviço sanitário de São Paulo. Seu projeto foi iniciado em 1905, funcionando até 1930. A obra era um anseio da sociedade, erguida por dedicação do Barão de Rezende e seu genro João Conceição. Nele, eram asiladas no máximo 30 pessoas, em 16 quartos, desde portadores do mal de Hansen até debilitados de atividades motoras ou cerebrais. Havia inclusive um imenso bosque no Sanatório - na Vila Rezende -, no qual eram receitados passeios para aquilo que se denominava como “cura de ar”. Foi o primeiro sanatório para tuberculosos do país. O ideal de sua criação foi propagado por Lydia de Rezende, filha do Barão, em memória a seu irmão Luiz, que morreu pela tuberculose.
 Em 1886, O recenseamento foi tão detalhado que se deteve até mesmo no percentual das enfermidades mais comuns. Em Piracicaba, foram registrados 32 alienados, 109 aleijados, 19 cegos, 16 morféticos, 21 surdos-mudos.


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