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quinta-feira, 9 de junho de 2022

23 de maio

 

Edson Rontani Júnior, presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba

 

O triste resultado da manifestação ecoou de forma tímida em Piracicaba. No dia 23 de maio de 1932, portanto, há 90 anos, a mídia local nada informou sobre o embate armado ocorrido na praça da República. Talvez não pela distância de 160 quilômetros entre nossa cidade e a capital paulista. Talvez porque a informação viesse de forma mais lenta que nos dias de hoje. A distância não era percorrida, à época, nas duras horas e pouco que levamos atualmente. Já a comunicação à distância tinha rápida (para a época) condução com o telégrafo, o qual necessitava de interpretação pelos que conhecessem o código morse.

Aquele 23 de maio, perpetuado depois como o Dia da Juventude Constitucionalista, foi o estopim para a Revolução de 1932 que dentro de um mês terá lembrado seus 90 anos. O cenário à época era de descontentamento com a Constituição em vigor, datada de 1891, a qual não delimitava os poderes do presidente da República que, por sua vez, governava o país como queria. Contra este autoritarismo, manifestantes vão às ruas da capital de São Paulo e, em certo momento, pretendiam invadir a sede no PPP (Partido Popular Paulista), simpatizante ao governo Getúlio Vargas. Membros do partido se municiam de armas e granadas. O resultado a história definiu como MMDC, sociedade então secreta que eclodiu com a insurreição civil contra o governo federal. MMDC foram perpetuados nas carteiras escolares do passado e muitos sabiam na ponta da língua que eram Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, mortos no 23 de maio.

Piracicaba possuía o “Jornal de Piracicaba”, “O Momento” e “Gazeta de Piracicaba”, jornais quase diários. Cada um composto por parcas quatro páginas. A cidade possuía cerca de 20 mil habitantes que se informavam por estes veículos. A reviravolta na capital paulista sequer saiu na imprensa daqui. O mesmo ocorreu com o fim da Revolução de 1932, no dia 2 de outubro, quando toda a imprensa paulista se calou diante deste fato visto que grande maioria de seus defensores foi deportada para Portugal.

O 23 de maio se tornou conhecido como a data dos jovens que clamavam pela liberdade e por direitos garantidos numa constituição. Foram jovens que partiram às ruas solicitando esta liberdade que hoje possuímos, sendo que os MMDCs tinham 14, 21, 25 e 30 anos. O mais moço era Dráusio Marcondes de Sousa (o D do MMDC), 14 anos, alvejado pelo PPPistas, falecendo dia 28 de maio. A juventude é também lembrada na Revolução de 1932 como o caso do escoteiro Aldo Chioratto morto em Campinas aos 9 anos depois de alvejado por uma granada lançada de um avião. Já em Piracicaba, o registro de jovens espelha-se em Natal Meira Barros, atingido no pescoço por uma rajada de metralhadora na cidade de Cruzeiro aos 17 anos, falecendo dias depois.

O Dia da Juventude Constitucionalista precisa ser lembrado com carinho o tanto quanto os paulistas olham para o 9 de julho. A Constituinte saiu em 1934, dois anos depois do embate. Nesta nova carta magna foram implantados direitos que ainda hoje usufruímos como a dissociação dos poderes executivo, legislativo e judiciário; defesa judicial com direito ao “habeas corpus”; ensino gratuito para adultos inclusive na zona rural e tantos outros.

A mídia impressa de Piracicaba passou a dar ênfase à causa constitucionalista a partir do 9 de julho, ecoando por aqui os ares paulistas. Este JP na edição de 12 de julho de 1932 entoava uma retórica que funcionou nos três meses da Revolução: “Matto Grosso ao lado de São Paulo. Enorme affluencia de civis aos postos de alistamento. Minas, Rio Grande e Santa Catharina integrados na arrancada paulista. Innumeras adhesões”. Com o tempo o governo federal esmagou as forças de oposição. Foi-se a causa, ficaram as memórias dos jovens do 23 de maio.

(Artigo publicado no Jornal de Piracicaba de 08 de junho de 2022)


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