Edson Rontani Júnior, jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba
Tudo
igualzinho como era antes. Claro que não exatamente como era antes. Vergonha.
Promessa descartada. Crescimento pessoal fica para a próxima. Reerguer a
cidade. Assim foi Piracicaba 92 anos atrás, ao término da Revolução
Constitucionalista de 1932.
Jornais
da época noticiam o retorno dos “voluntários de Piracicaba” que pegaram armas
para evitar o avanço das forças federais. Armas por uma causa democrática ? Sim
! Afinal, paulistas queriam uma Constituição nova, com ares modernos, conforme
Getúlio Vargas havia prometido em 1930 quando tomou posse. Aliás, este ar de
nova constituinte já vinha de uma década antes.
Mas,
São Paulo “perdeu”. Se rendeu em 2 de outubro para surpresa geral. Os jornais
da época falavam que o Estado paulista estava vitorioso, que as mortes
registradas até então tinham valido a pena pois a nova lei magna nacional
estava surgindo. Ledo engano. Piracicabanos, assim como os demais paulistas,
retornavam para casa, para seu lar, talvez conseguissem recolocação no mesmo
posto de trabalho... “Teria valido a pena ?”, pensou aquele voluntário que foi
se embrenhar nas trincheiras do norte do Estado pensando em conseguir um bom
emprego como lhe haveria sido prometido. A cidade teve de se reconstruir. Não
que tivesse sido bombardeada, mas a economia estava em frangalhos. A rotina
teria que voltar imediatamente à normalidade depois de três meses de
imprevistos sociais, econômicos, familiares ... de tudo que é tipo.
Piracicaba
perdeu mais que dez filhos na Revolução de 1932. Foram poucos, podem pensar o
nobre leitor. Mas, contesto. Foram muitos, pois a famílias despedaçadas sabem o
quanto sofreram por suas mortes, perpetuadas por décadas pelos irmãos, filhos e
parentes como um todo. Tudo isso sempre foi lembrado nas celebrações anuais do
9 de julho até o falecimento do último Voluntário de Piracicaba, Romeu Gomes,
em 17 de junho de 2016, aos 100 anos de idade. Eram pessoas como ele que
levantavam a bandeira de todo o entusiasmo que tiveram os piracicabanos que se
envolveram com esta que foi a última insurreição armada em solo brasileiro.
Falam de 600 ... 800 ... 2.500 envolvidos direta ou indiretamente. Apenas em
nossa terra ... O número nunca foi e nunca será exato. Os filhos destes
voluntários, como parte natural da vida, também estão indo embora. Torcemos
para que tenhamos por aqui alguém que empunhe a bandeira para a celebração do
centenário da Revolução Constitucionalista daqui oito anos.
À
época, a cidade ainda chorava seus mortos como vemos neste relato: “Os
denodados e valorosos voluntarios piracicabanos, que na cidade se encontra de
regresso das linhas de fogo, cogitam de levar a effeito uma romaria aos túmulos
onde descançam (sic) os seus irmãos de ideal, sacrificados na luta pela
redempção do Brasil. Ideia elevada, que partiu de corações nobres, ella
demonstra bem o sentimento de fraternidade que a todos irmanou quando da
deflagração do movimento constitucionalista”. Jornal “O Momento” de 8 de
outubro de 1932.
Jacob
Diehl Neto, na Gazeta de Piracicaba, de 19 de outubro de 1932, relata seu
desabafo: “Soldado raso do Primeiro Batalhão Piracicabano, que saiu desta
cidade em 16 de Julho, como soldado entrei para as trincheiras (...) ao lado de
tantos outros bravos camaradas, que me orgulho de haver acompanhado, em
Palmeiras, Santa Rita, Tres Pontes, Batalhão, Bocaina, Quebra-Cangalhas e Cóta
Queimada, até 24 de Setembro, data em que a minha claudicante saúde, trabalhada
por sessenta ásperos dias de campana, pelos meus quarenta e dois annos de edade
e pelas ultimas chuvas, me forçou a depor o fuzil e regressar para casa.
(...) Essas Companhias chegaram a Areias altas horas da noite, em
caminhões, e os seus soldados tiveram de dormir ao léo... Lembro-me de ter
visto o sargento Jones na calçada, o prof. Antonio Oswaldo Ferraz num caminhão,
o meu filho numa casa paupérrima e abandonada, estendido no soalho. Depois de
muito vagar, achei pouso na sala do jury... No dia seguinte, num rancho commum
para os soldados sem transito, tomámos uma caneca de café e recebemos um pão
minúsculo. Logo entrámos em fórma, ouvimos algumas palavras do Cel. Andrade e,
separados em grupos de vinte ou tinta, sem que pudéssemos ao menos abraçar, e
sem almoço, tocámos para as linhas de foto – uns para Palmeiras, outros para
Santa Rita, outros mais para Barreiros, outros ainda não sei onde ...”. E, assim, voltamos à normalidade em terras
piracicabanas.
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