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domingo, 2 de agosto de 2020

Um certo capitão ...

Edson Rontani Junior, jornalista



Tudo surgiu muito antes do que se pensa. Mas, como se sabe, a história é contada pelos vencedores. Assim, Piracicaba tem seu marco de fundação como sendo o primeiro de agosto de 1767. É a data oficial em que se fixou moradia por aqui, sendo que a região, desde 1693, era apenas um entreposto para bandeirantes. Era um ponto de passagem.

Em seu “Manual de História Piracicaba”, escrito por Guilherme Vitti e publicado pelo Jornal de Piracicaba durante as comemorações do segundo centenário de Piracicaba, o autor diz que a distribuição da Sesmaria de Piracicaba (primeiro nome de nosso vilarejo), ocorre na década de 1690 sem o propósito de sua ocupação. Quase um século mais tarde é elevada à Povoação, graças a Antonio Correa Barbosa, destinado a ser o povoador da cidade.

Recebemos diversas denominações como Freguesia de Piracicaba, Vila Nova da Constituição (em homenagem à carta magna de Portugal), Cidade da Constituição e, em 1887, é oficialmente denominada de Cidade de Piracicaba. Registros históricos demonstram que em 1693 a sesmaria de Piracicaba foi requerida por Pedro de Morais Cavalcanti, justificando que pretendia povoar a região. Ficou só na intenção ...

Mas, de onde vem seu nome? Bom, cada cabeça tem uma sentença. O mais popular (“lugar onde o peixe para”) teve várias outras interpretações como “peixe que chega”, “lugar onde chega o peixe”, “colheita de peixe”, “lugar onde se ajunta peixe”, “rio por onde sobem os peixes”, ou “lugar em que se apanha o peixe com facilidade”.

O nome veio de uma expressão indígena que, segundo Vitti, era falado como “percicaba”, “piracicava” ou “piracicaba”. A história foi tão ingrata que não se sabe quais índios instituíram o nome de tão bela cidade interiorana. O autor arrisca dizer que podem ter sidos tribos dos barranqueiros, guaianeses, caiapós ou colorados, que sumiram com o tempo após serem acuados por outras tribos mais fortes ou, ainda, serem índios nômades em vias de extinção.

O capitão-mor de Itu, fez o primeiro registro da tradução de seu nome. Disse Vicente de Costa Taques Góes e Aranha, em memórias escritas em próprio punho durante a fundação da cidade, que aqui é “onde o peixe chega” ou “lugar onde chega o peixe”. O resto, é lenda. Ajuda a alimentar a imaginação humana.

Antonio Correa Barbosa veio para mudar a história. De entreposto, ele criou a vila que começaria bem ao lado do rio Piracicaba.  Ocupou parte de onde, quatro décadas antes, havia sido concluída parte da estrada (“picadão”), que levaria os bandeirantes para o Mato Grosso durante a “febre do ouro” brasileira. O local serviria de destino para Cuiabá e tinha a vantagem do rio Piracicaba estar próximo ao rio Tietê, alternativas para navegação rápida ao centro-oeste brasileiro.

Porém, no meio do rio havia piranhas! Ou melhor índios paiaguás e caiapós que lançavam flechas sobre os desbravadores. A história conta que, de uma expedição com cerca de 300 homens brancos, os índios deixarem apenas cinco para que contassem o feitio para a posteridade.

O sertanista Antonio Correa Barbosa aparece neste meio tempo como povoador da junção do rio Piracicaba como Rio Tietê. Lá, ele deveria gerir um depósito de sal, uma fábrica de canoas e cultivar cereais para a colônia Forte de Iguatemi, divisa de onde depois seria criado o Paraguai. O local era pantanoso. Desagradou nossoo povoador. Este, pegou sua comitiva de desbravadores (aproximadamente 40 pessoas) e percorreu o Piracicaba até chegar onde hoje conhecemos como a mata ciliar entre Piracicaba e Limeira. Os desbravadores eram vadios (homem sem local fixo de trabalho), dispersos (homem sem família constituída) e vagabundos (andarilho e sem moradia fixa), termos, segundo Guilherme Vitti, que seguiam as colocações usuais de então. Barbosa tinha 32 anos à época da fundação.

Já por aqui estabelecido, em 1770, o capitão-general da província de São Paulo incumbe Correa Barbosa de reabrir o picadão para o Mato Grosso. Conclui a obra em quatro meses, recebendo em seguida o título de Capitão-Povoador.

Já na década de 1770, Piracicaba passa a atrair a atenção dos moradores de Itu, Porto Feliz e São Carlos (distrito de Piracicaba), que por aqui vem constituir moradia e família. Isso fez com que, de vilarejo, a capitania propusesse a criação de uma povoação, o que ocorreu em 31 de julho de 1784, data em que a cidade se expande além rio Piracicaba. Foi neste dia em que se delimita o primeiro arruamento da cidade. Antonio Correa Barbosa teria de expandir a cidade para um perímetro estipulado entre o rio Piracicaba e ribeirão do Itapeva (hoje avenida Armando de Salles Oliveira) findando-se próximo à área do Terminal Rodoviário Intermunicipal.

Esta seria, num brevíssimo relance, a vida em de Piracicaba há 253 anos atrás. Tudo iniciado por um certo capitão ... 

(Artigo publicado no Jornal de Piracicaba em 29/07/2020 e expandido para esta versão publicada na Tribuna Piracicabana de 01/08/2020)

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