Edson Rontani Júnior, jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba
Leandro Guerrini escreve certa vez que os jornais começaram a circular em nossa terra 200 anos atrás, trazendo ecos de um moderno Brasil que acabara de se tornar independente de Portugal. Até então, obras impressas, como os livros, eram rodadas em Portugal ou na Inglaterra, grande parceiro comercial dos portugueses. Era tudo caro, exigia altos investimentos em maquinário e pessoal. Assim, personalidades fizeram jornais à sua moda, escritos a mão, distribuídos entre os mais influentes – e tão somente aos “letrados”, ou alfabetizados – e por vezes pregados à porta da igreja matriz, onde, com certeza, havia concentração rotineira.
Quando
surgem os jornais no Brasil aparece um certo desconforto principalmente por
parte da imprensa que tinha de produzir conteúdo, revisar, imprimir e
distribuir. Não existiam as bancas de jornais e revistas. Estas eram
denominadas de bibliotecas por reunir produções escritas em papel. Jornais e
livros tiveram grande impulso, em especial na Europa, em meados do século
retrasado, servindo de entretenimento durante viagens de trens, muitas delas
longas nas quais era pouco ler um único livro, tão demorado o trajeto.
O
jornal “O Estado de São Paulo”, em sua edição de 4 de janeiro passado,
comemorativa aos 150 anos de fundação, trouxe dados curiosos sobre sua
impressão e distribuição. As primeiras edições – quando ainda era chamado de “A
Província de São Paulo” – tinham impressão de 2 mil exemplares, cuja
distribuição era restrita a capital paulista, que eram entregues a assinantes
ou colocados a disposição para compra em sua redação. Bernard Gregoire,
francês, trouxe o know how adquirido em terras parisienses aceito pela direção
do jornal que era sair às ruas, montado em um cavalo, vendendo as edições
diárias do Estadão. Começa aí uma nova etapa da logística do jornalismo. Um
francês barbado, com touca e uma vestimenta que lembrava um membro da legião
estrangeira e ainda tocando uma corneta era uma figura exótica que chamou a
atenção dos mais letrados, os quais a princípio o condenaram pela irritante
corneta. Era a forma de chamar atenção que ainda hoje é praticada com o
amolador de facas que percorre as ruas, o vendedor de biju ou até o carro da
pamonha. Gregoire virou ex-libris e estampa o Estadão até hoje num cavalo com
uma corneta à mão.
Entre
os anos 1700 e 1800 a imprensa, não apenas brasileira, vivia sobre a batuta
governamental. Os fatos publicados eram aqueles de interesse de quem estivesse
no poder, no caso do Brasil, o regente. Não havia imparcialidade muito menos
eram ouvidos os dois lados. Na proximidade do surgimento da República o cenário
muda.
Por
isso é comum ver jornais antigos com sua titulação e uma referência como “órgão
independente”. A profissionalização da imprensa surge na Europa no início dos
anos 1800, fazendo da notícia apurada um produto de considerável custo
financeiro. Surgem depois as publicidades atreladas a um conteúdo confiável.
O
“Estadão”, quando foi instaurada a República, estampou em sua capa que não era
“órgão de partido político algum, nem estando em seu intuito advogar os
interesses de qualquer deles”.
Em
Piracicaba, o jornal “Gazeta de Piracicaba” trazia este exemplo. Criado na
transição de Império para República, o matutino trazia abaixo de seu nome
slogans como “Orgam Imparcial” (1882), “Folha popular” (1886/87), “Propriedade
de uma Associação” (1892) e depois, como modismo midiático em quase todo o
Brasil, “Orgam Republicano” (1893/96 e 1903). A Gazeta teve sempre seus ideais
republicanos, não apenas nos períodos citados, sendo que na primeira edição do
jornal é explícito o apoio ao Regime. Estudos indicam também que além de
republicano o jornal tinha fortes ligações com a maçonaria visto que os
defensores locais da República eram de lá provindos.
Anteriormente
a cidade abrigou jornais com viés monarquista com o Jornal do Povo (1880/89) e
O Piracicaba o qual abusava dos ideais do Partido Liberal. E assim a liberdade
foi trocada pela imparcialidade.
(Publicado no Jornal de Piracicaba de 08 de fevereiro de 2025 e na Tribuna Piracicabana de 15 de fevereiro de 2025
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