Edson Rontani Júnior, jornalista e cinéfilo
Versão: seu ponto de vista ou modo de contar o que assimilou sobre determinado conteúdo. Assim Walt Disney fez com “Branca de Neve e os Sete Anões”, de 1937, o primeiro longa-metragem da empresa, feito com tecnologia inovadora à época. Disney adaptou à sua moda a versão clássica de um conto popular. A obra motivou “O Mágico de Oz”, em 1939, pela Warner Bros. Também inovador. Em desenho, carne e osso ou live-action, são versões de contos folclóricos, autorais ou não.
Os
Estúdios Disney retornam agora com a franquia das princesas dirigida por Mark
Webb a qual teve estreia nacional em março passado. Evite comparações. Assim
como os desenhos animados de grande sucesso no passado repaginados como “Rei
Leão”, “A Pequena Sereia” ou “Aladim”. O jeito de pensar mudou nas últimas
décadas e com isso inovações são necessárias como a inclusão de gêneros sexuais
ou empoderamento feminino, ou ainda aversão ao tabaco e a luta na preservação
do meio-ambiente.
Branca
de Neve era um conto com sua versão original propagada de geração em geração na
Europa. Um conto para adultos, aliás. Assim como boa parte dos atuais contos
infantis. Você já leu o original de Chapeuzinho Vermelho? Arrepia qualquer um! Já
a Branca tem situações aversas à ilusão criada por Disney. Dormia com um dos
anões. Não foi salva pelo beijo de um príncipe, que, diga-se, a despertou
ocasionalmente quando carregava seu caixão, tropeçando e fazendo, diante da
queda, com que ela cuspisse o miolo da maçã que havia comido e entalado em sua
garganta.
A
nova Branca de Neve da Disney tem pontuações atuais. Branca de Neve sonha em
liderar o povo no condado em que vive. Não pregando guerra e sim bondade e
generosidade, como fizeram seus pais. O príncipe encantado é trocado por um
serviçal do rei que a denuncia quando está roubando mantimentos do castelo
real. Os anões também foram adaptados ao politicamente correto contemporâneo:
não são anões pois isso geraria apologia ao nanismo. Possuem a mesma altura da
Branca de Neve e são descritos como criaturas mágicas com mais de 1/4 de
milênio de vida.
As
histórias originais nunca foram criadas para acolher corações frágeis. O
escapismo é uma alternativa criada pelo cinema como forma de arrecadar
bilheteria, através do tal “final feliz”. Contos clássicos foram feitos para
assustar os adultos com moral de punição, barbárie social e assim vai.
O
cinema prepara a terceira versão Disney – não feita por este estúdio – com tons
de horrores. Alladin começa a ser filmado em maio por Charley McDougall.
Anteriormente, Ursinho Pooh e Mickey arrepiaram os amantes da sétima arte.
Ninguém gostou, claro.
Mas,
de onde surgiram essas versões? Os contos da mil e uma noites tem sua origem no
Oriente Médio, mas foi somente lá por 1700 que alguém os colheu e publicou numa
única produção impressa. Isso graças à prensa criada por Gutenberg lá por volta
de 1450. Agora era possível tirar várias cópias de documentos. Era um
trabalhão. Mas a matriz era propagada e perpetuada concorrendo com a língua
viva.
Foi
neste pensamento comercial que surgiram iniciativas como a do francês Antoine
Galland que compilou histórias coloquiais árabes como os Contos da Mil e Uma
Noites. Não que a cultura árabe detenha o original de certas obras, isso por
que na Índia já eram contadas essas histórias, por longos séculos.
Charles
Perrault, outro francês, no final do século 1600 teve ideia idêntica e criou o
livro “Contos dos tempos passados”, um estrondoso sucesso com Bela Adormecida,
O Gato de Botas, Cinderela e outros que caíram no gosto popular.
Já os irmãos Grimm – Jacob e Wilhelm, linguistas alemães, registraram as principais fábulas infantis que conhecemos por livros, revistas ou pelo cinema, utilizando inclusive os originais de Perrault. De originalidade, nenhuma. Colocaram no papel aquilo que era falado no dia a dia, vindo de povos antigos como os indígenas. E, como contaram um conto, acabaram sempre aumentando um ponto. E tire assim, sua melhor versão do que você assimila.
(Publicado no Jornal de Piracicaba de 1º de maio de 2025 e na Tribuna Piracicabana de 10 de maio de 2025)
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