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domingo, 12 de novembro de 2023

Exaltação aos quinzistas

 Edson Rontani Júnior, jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba

Chegando aos seus 110 anos de fundação, o Esporte Clube XV de Novembro de Piracicaba vem sendo exaltado nos últimos dias. Muito de sua história se torna repetitiva e aqui o objetivo é destacar alguns dos “esquecidos” que em muito contribuíram para nosso alvinegro. Esse universo vai além dos comendadores que o dirigiram e dos medalhões que por ele passaram. Para conhecer ou reler estas histórias, basta acessar o Google. Já aqueles que cuja memória foi perdida com o passar do tempo merecem ser relembrados.

O XV estreou no dia seguinte à sua fundação, 16 de novembro de 1913, perdendo por 2 a 0 para o Sport Recreio Normalista. O time era formado por Alberto Franklin Oliveira, Vicente Mastrandéa e Antônio Dihel, Francisco Pelegrino (Paco), Antonio de Laringa e Belmácio Pousa; Edmundo Huffenbacher (Guinho), Milton Salvinho Provenzano, Francisco Pousa e Luciano Servija. No banco de reservas: Laércio e José Pousa de Toledo (Tutu Pousa).

Poucos devem se lembrar. O alvinegro foi campeão do Torneio Interior Paulista de 1935, organizado pela Associação Paulista de Esportes Atléticos. O time possuía em seu elenco os Alcides I e II, Áureo, Godoizinho, Leme, Moacir, Mônaco, Petrônio, Nenzo, Roque e Venerando, numa época que o esporte futebolístico era mais diversão do que profissionalismo. Cabe abrir um parêntese aqui. Na época, o futebol não era visto, remunerado e reverenciado como hoje. As primeiras copas mundiais as quais a Seleção Brasileira enfrentou ocorreram “na raça”: os jogadores viajavam para o exterior em navios cargueiros, e dormiam entre sacos de café, arroz e feijão. A estes heróis é dedicado este texto.

Gente que ficou nos bastidores e sequer entrou para a história, como os responsáveis pela iluminação noturna (uma revolução na época) em 1941 no então Estádio do XV, depois Estádio Roberto Gomes Pedrosa (onde encontra-se hoje o Assaí, Centro).

Vale citar outros pioneiros, como o argentino José Agneli que figura no panteão do alvinegro piracicabano. Foi treinador do XV de 1951 a 1954 criando estrutura e organograma do time que havia subido para a elite do futebol paulista em 1949.

Thales Castanho de Andrade foi além da dedicação à literatura. Com Monteiro Lobato divide o pioneirismo da escrita voltada para as crianças, com obras publicadas nos anos 1920 e 1930 pela Editora Melhoramentos. Também presidiu o E. C. XV de Novembro.

Outro expoente das artes, Erotides de Campos também tem seu espaço no amado XV. Foi um dos fundadores do time em 1913 atuando como primeiro secretário da primeira diretoria do alvinegro.

Silvio Lagreca (1895/1967) foi renomado jogador do XV nos anos 1920, atuando em times de São Paulo e Rio de Janeiro, sagrando-se campeão paulista e brasileiro. Era irmão do poeta Francisco Lagreca.

Outro artista que passou pelo elenco, foi Antônio Osvaldo Ferraz, Tonico, sócio de Haldumont Campos Ferraz (Tico da Farmácia) na Farmácia Coração de Maria, ao lado da matriz de Santo Antonio. Na adolescência defendeu o alvinegro e anos depois dedicou-se ao ensino. Foi colaborador de diversos jornais. Editou “Folclore”, revista reverenciada pelo modernista Mario de Andrade.

A multifuncionalidade era necessária. “Bita” ou Jamil Antônio (1927/2004) atuou como goleiro no time local além de ser árbitro. Algo impensável: trocar o futebol pelo tênis. Isso ocorreu com Júlio Marcos (1911/1998) que jogou no XV de 1941 a 1946 trocando o esporte pelo tênis em 1948, atuando por dez anos na área e considerado o tenista número um da cidade, defendendo a equipe de tenistas do Clube de Campo.

Uma citação a parte é de Belmácio Pousa Godinho (1892/1980), um dos fundadores do XV e ala direita do time. Foi músico na Orquestra Lozano. Além da bola, animava filmes mudos nos cinemas. Foi musicista na época em que partituras musicais funcionavam como presente e discos de 78 rotações por minuto figuravam como elevado sonho de consumo. Em 5 de fevereiro de 1916 a revista “O Malho”, editada no Rio de Janeiro, publicou em suas páginas centrais a letra da música “Sport Club 15 de Novembro, Campeão Piracicabano”.

Gato Preto era a alcunha de João Marques de Oliveira (1923/1995), goleiro do XV estreando no time aos 21 anos em 19 de março de 1944, três anos antes da criação do futebol profissional no estado. Foi campeão do Torneio Início da Liga Piracicabana de Futebol.

“Estrangeiros” que por aqui aportaram também carregam o time no peito, como o caso de Severiano Alberto Ferraz (1869/1951), farmacêutico nascido em Portugal (Madeira) e estabelecido em Piracicaba na Farmácia Neves. Foi diretor de agremiações esportivas e um dos primeiros e maiores compradores de “ações” para criação do XV no ano de 1913.  

Exaltar heróis anônimos ou conhecidos é levar à glória um time centenário amado por toda uma cidade, algo difícil de se ver nos dias atuais. Esporte é uma linguagem universal que anima, envolve e cria emoções, amizade e envolvimento. Parabéns a todos que construíram este século e uma década deste ícone local.

Publicado no Jornal de Piracicaba de 12 de novembro de 2023 e na Tribuna Piracicabana de 15 de novembro de 2023

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