Edson Rontani Júnior, jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba
Pegou fogo no vagão 22 da Cia. Férrea Ythuana. Nele estava uma carga de algodão em rama, adquirida por Luiz de Queiroz que seria manufaturada para criar tecidos em sua fábrica Santa Francisca. Esse era o teor de uma manchete do jornal “Gazeta de Piracicaba” de 6 de abril de 1878.
Tal fato mereceu destaque na imprensa local tamanha era credibilidade
que possuía a empresa inicialmente denominada Santa Francisca, depois
Arethusina e finalmente Boyes. Era uma das três principais indústrias da
cidade, junto à Usina Monte Alegre e Engenho Central.
Este princípio
serve para relatar a importância que teve na cidade o empreendedor Luis de Queiroz
que, embora tenha vivido pouco – faleceu aos 49 anos – deixou grandes marcadas
na cidade.
Nascido em um bom
berço, Luiz Vicente de Souza Queiroz (nasceu e faleceu em São Paulo, 1849/1898)
vinha de família abastada sendo filho do barão de Limeira - Vicente de Souza Queiroz
- e de Francisca de Paula Souza, filha do conselheiro senador Antônio Francisco
de Paula Souza, o criador da Escola Politécnica de São Paulo. Era o quinto de
15 filhos. Casou-se com Ermelinda Ottoni de Souza Queiroz, filha do conselheiro
do Imperador, senador do Império e engenheiro Christiano Benedicto Ottoni.
Sua saga começa
quando parte para a Europa aos oito anos, permanecendo no exterior por 16 anos,
nos quais estudou agronomia e veterinária na França e Suíça. Em 1873 ele regressou
ao Brasil para tomar posse da herança deixada pelo pai. O processo de herança
ocorreu na capital paulista, no cartório 2º Ofício de Órgãos e Ausentes, dando
a Luiz a Fazenda Engenho D’Água, na época um mundaréu de capim situado à margem
esquerda do rio Piracicaba. Surgia no local o embrião daquilo que conhecemos
por Boyes.
A fazenda havia
sido comprada pelo Barão de Manuel Rodrigues Jordão e, quando vendida ao barão
de Limeira, já possuía moinho, monjolo e serraria, tudo movido com a força da
água. Já notou que há um desvio do Piracicaba para dentro da Boyes ? Pois bem,
como não existia energia elétrica na época, a força da água era captada para
gerar energia. Segundo Maria Celestina Teixeira Mendes Torres em “Piracicaba no
Século XIX” (Editora IHGP), foi a primeira usina termelétrica do interior.
A história diz
que em 1º de julho de 1874 são iniciadas as obras da empresa que décadas depois
seria conhecida por Boyes, data em que foi colocada a pedra fundamental do
empreendimento, abençoada pelo reverendo padre João de Almeida. A cidade parou.
Houve música tocada por uma banda e servido “refresco” a determinados
convidados numa casa próxima à fábrica de tecidos. Luiz de Queiroz foi recebido
na mesma noite para uma ceia animada acreditando no benefício que a nova
indústria viria a trazer a Piracicaba. “Um brinde ao amante do progresso” teria
dito alguém. Oficialmente, a data de inauguração da Fábrica de Tecidos Santa
Francisca ocorre em 23 de janeiro de 1876.
Em 23 de setembro
de 1876 o jornal “O Piracicaba” publicava anúncio dizendo que a fábrica de
Queiróz tinha produtos que se equiparavam ao produzido em Petrópolis e vendia
panos de primeira linha dos tipos tinto, riscado e mesclado.
A cidade
novamente se desenvolvia à margem do rio Piracicaba. Foi na Boyes que surgiu a
primeira linha de telefone na cidade. Ela ligava a empresa de tecidos à Fazenda
Santa Genebra, não muito distante dali. O assunto foi noticiado pela Gazeta em
11 de outubro de 1882. Curiosidade: os postes de telefone passaram a ser
atração aos moradores.
Outro
pioneirismo: a instalação da luz elétrica. Na época, os postes era acessos com
querosene e apagados no meio da noite por um funcionário público. A luz
elétrica – em residência particular, portanto, não iluminação pública – teve
seu auge na cidade durante a visita do Conde e da Consessa d’Eu (ela, a
Princesa Isabel). Vieram para Piracicaba em 12 de novembro de 1884 visitando a
fábrica de tecidos e o Palacete Boyes.
Capitalista, Luiz
de Queiróz era uma pessoa que fazia dinheiro com o próprio dinheiro. Vivíamos
numa época em que os tecidos eram comprados por rolos ou como se dizia
antigamente por “fazenda”. Não existiam roupas prontas como temos hoje. Eram
feitas por habilidosos alfaiates e demoravam dias ... semanas ... para ficarem
prontas. Assim, a fábrica de tecido supria o mercado de uma necessidade vital
num período em que a moda exigia vestidos longos com mangas compridas para
mulheres e paletós para os homens. Tanto que a concorrência botou “zóio gordo”
na Santa Francisca. Em 2 de outubro de 1890 a Câmara de Vereadores indefere o
pedido de Antonio Teixeira Mendes e Manuel Pereira Granja de construírem uma
fábrica de tecidos entre a fábrica de Queiroz e a praça André Sachs. E viva o
monopólio !
Em abril de 1893,
Queiróz incorpora todo seu patrimônio, depois de quase 20 anos de atividade, à
Companhia de Cultura de Tecidos de Algodão S/A, sediada no Rio de Janeiro.
Leandro Guerrini em “Piracicaba em Quadrinhos – Volume 2” diz que a
incorporação não deu certo. Em 1897 a empresa encerra temporariamente suas
atividades. Mas a história continua ...
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