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quinta-feira, 29 de maio de 2025

Imprensa local

Edson Rontani Júnior, jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba

Ainda evocando a mídia local, vários nomes surgem. Muitos deles são dos impressos, tal qual das pessoas que fizeram a arte da escrita diária na Noiva da Colina. Universo estritamente masculino por muito tempo, relembraremos alguns profissionais que escreveram nossa história dia a dia. Outros conduziram a imprensa como diretores ou proprietários. Aliás, rica é a história de Piracicaba contada na época do Império através das páginas da Gazeta de Piracicaba que surgiu em 1882 e até o final do século narrou a rotina local, sendo fonte de pesquisa para os Almanaks posteriores assim como para historiadores como Mário Neme, Leandro Guerrini, Guilherme Vitti e tantos outros aos quais Piracicaba deve se render por ter viva esta tão longínqua memória.

“Piracicaba”, pelos registros existentes, foi o primeiro jornal local. Totalmente precário – era escrito a mão – com textos de Brasílio Machado que aguça a curiosidade de qualquer um para saber como ele enxergava a sociedade no ano de 1874 quando lançou o periódico em 4 de julho. Assim como outros jornais, circulava de quarta e sábado, cobrindo os fatos semanais. Curioso é ver que esta periodicidade reinou na cidade quase até os anos 1940. Quem sabe Piracicaba fosse pacata demais e as notícias não circulavam como na atualidade...

A Gazeta teve como proprietário Mário Arantes, renomado professor do ensino elementar. Antes dele, na sua primeira circulação em 10 de junho de 1882, seus responsáveis foram Vitalino Ferraz do Amaral e José Gomes Xavier. Ferraz era conhecido por seus discursos inflamados sendo orador na inauguração da água encanada e na comemoração pela proclamação da República.

Outro professor de renome nacional foi Alceu Maynard Araújo que por muitas vezes utilizou-se do pseudônimo Almayara, numa corruptela das iniciais de seu nome. Recentemente, a Cinemateca Brasileira resgatou uma obra sua, não impressa, e sim um documentário em celuloide que mostra as regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste brasileiro. Foi um expositor exemplar das culturas e do folclore interioranos.

Dias atrás, aqui nestas páginas, foi escrito sobre o vínculo de piracicabanos com Monteiro Lobato, grande inteligência deste país. Pedro Ferraz do Amaral foi um destes nativos que partiu para a capital atuando como secretário de redação nos anos de 1923 e 1924 da “Revista do Brasil”, importante produção de Lobato em parceria com Breno Ferraz do Amaral (seu irmão). Pedro também atuou na imprensa paulistana em “A Tarde”, “Correio Paulistano”, “Gazeta”, “Diário da Noite” e “Diário Nacional”. Breno do Amaral foi levado à capital pelo amigo Léo Vaz. Aqui em Piracicaba ambos assinaram o semanário “A Noiva da Colina”. Na capital atuou no “Estado de S. Paulo”, “Diário Nacional” e “Correio de S. Paulo”.

Se houve quem fazia a matéria-prima do jornalismo, existiu também aquele grupo que colocava palavras e pensamentos no físico, o tangível jornal, ou a revista ou ainda o livro. Um destes que por toda a vida dedicou-se ao texto impresso foi Fernando Aloisi, falecido em 1965. Deixou uma herança ainda viva em muitas hemerotecas e bibliotecas. A Tipografia Aloisi publicou os principais trabalhos dos grandes pensadores locais. Aloisi esteve na fundação do jornal “O Momento” e também no segundo “Diário de Piracicaba”, 1935.

Nas páginas dos matutinos, “Piracicaba não é cidade morta” nominou uma coluna publicada no “Jornal de Piracicaba” por Silvio de Aguiar Souza, pela alcunha de Antônio Calixto. Ironia ácida sobre a sociedade local com direito a colocar o dedo na ferida. Seu pai, Osório Dias de Aguiar e Sousa lhe inspirou a verve jornalística. Este, por sua vez, colaborou com jornais locais e de Capivari, onde nasceu. Escrevia sob o pseudônimo Orênio Sabaúna. Além da escrita de extensa criação de poesias e artigos, foi jurista e juiz de direito em várias cidades interioranas. Rica história.

quinta-feira, 22 de maio de 2025

Imprensa

Edson Rontani Júnior, jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba

A imprensa local sempre foi fonte de informação e credibilidade. Esta velha imprensa está completando 225 anos. Pelo menos é o que se pode afirmar com base em testemunho dos anos 1970 dado por Jair Toledo Veiga que, na ocasião, disse ter encontrado jornais do início do século 1800. Eram rústicos, escritos a mão, com poucas cópias e entregues aos letrados. Na redação, o depois senador Vergueiro fazia críticas à sociedade que possuía menos de 2 mil habitantes.

Cravado na história ficou o semanário “O Piracicabano”, cujas algumas edições podem ser consultadas online na Biblioteca Nacional. O coronel Joaquim Moreira Coelho era seu proprietário. Respirava ares da monarquia entre 1876 e 1885, mas tinha seu viés crítico contra quem estivesse no poder. Coelho também imprimiu “Lavrador Paulista” a partir de janeiro de 1888.

“O Diário da Manhã” foi outro representante da imprensa noivacolinense, porém, com vida curta, já que circulou de 1928 a 1930. São raras as edições existentes ainda hoje deste veículo mantido por Ernani (Leite do Canto) Braga. Embora formado em farmácia, exercia o jornalismo de forma legal, pois não havia na época estudo acadêmico para isso. Deixou artigos e poesias publicados principalmente no “Jornal de Piracicaba”.

Das prensas locais, conterrâneos também se destacam nos jornais além rio Piracicaba no auge do jornalismo (antes do rádio e da TV). Otacílio Silveira de Barros fez parte de “O Estado de S. Paulo” atuando na época de Monteiro Lobato. Leonel Vaz de Barros ou Léo Vaz também trabalhou neste jornal paulistano. Porém, lá por 1911, deixou suas pegadas em Piracicaba com o semanário “Noiva da Colina”. Foi na cidade de São Paulo que participou da criação da “Folha da Noite” em 1921 e do “Diário da Noite” em 1925. Na época, os jornais chegavam aos leitores no período da manhã. Para atualizá-los mais rapidamente, em todo o país pipocaram jornais a tarde ou a noite. Léo Vaz conheceu Monteiro Lobato e juntos atuaram na “Revista do Brasil”, hoje um ícone da imprensa que reuniu os principais pensadores brasileiros dos anos 1920. Vaz foi supervisor da revista de Lobato.

Bento de Arruda, nascido em Piracicaba, partiu para São Paulo onde também se associou a Monteiro Lobato. Foi na sua editora que ele publicou, em 1924, o livro “Por campos e vales”. Era amantes de plantas e caças. Colaborou como a “Revista do Brasil” e a revista “Chácaras e Quintais”, dois grandes sucessos entre os anos 1920 e 1950.

Um importante jornal local esquecido pelo tempo foi “O Momento” que teve seu peso na balança enquanto circularam o “Jornal de Piracicaba” e a “Gazeta de Piracicaba”. Um de seus proprietários foi Moacyr Amaral dos Santos, de 1931 a 1936, que chegou a ser juiz do Supremo Tribunal Federal nos anos 1960. Neste matutino também escrevia Haruni Al Rachid, pseudônimo utilizado por Elias Barreto, jornalista e escritor que atuou no Jornal de Piracicaba e em Limeira.

A imprensa local também foi trampolim para muitas carreiras políticas. Antonio de Moraes Barros foi redator da “Gazeta de Piracicaba” na década de 1890. Formado em direito, exerceu quatro legislaturas como deputado estadual além de deputado federal. Era sobrinho de Prudente de Moraes.

Cada exemplar, uma voz. Por isso surgiam vários títulos na cidade. Jornais, como expressado anteriormente, sempre foram fonte de credibilidade da sociedade. Neste pensamento, surgiu “O Popular”, que circulou de agosto de 1899 a fevereiro de 1890. José Gomes Xavier de Assis era seu proprietário. Criou-o quando estava na “Gazeta de Piracicaba”, auxiliado por Vitalino Ferraz do Amaral em sua manutenção. “O Popular” tinha como proprietário o Barão de Rezende e na sua tônica, pensamentos monarquistas.

Samuel Pfromm Neto nos ensina que o “Diário de Piracicaba” surgiu na cidade em janeiro de 1935 circulando até maio do ano seguinte. Estavam no comando Jacob Diehl Neto, Octaviano de Assis e Fernando Aloisi. Linotipos e prensas rodaram soltos na cidade. Afinal, são mais de dois séculos de história.  

quinta-feira, 15 de maio de 2025

Eu, gênio

Edson Rontani Júnior, jornalista e cinéfilo 

Temente a Deus e com vontade de dormir. Duas condições humanas assumidas por um gênio no filme “Era Uma Vez Um Gênio” (2022). Nesta produção hollywoodiana vemos um George Miller menos comercial, muito intimista, e buscando suas raízes. O australiano de 80 anos consegue colocar nossa cabeça em parafuso ao abordar o tema de um Aladim em tempos atuais. Vai além das concepções profundas do amor, do desejo e da desilusão pregadas por Jung ou Freud.

Miller deu umas derrapadas em sua carreira para o bom amante do cinema, mas que renderam ótimas bilheterias, como “Babe” e “Happy Feet”, filmes para família ou infantis. Começou com uma carreira promissora com a franquia Mad Max em 1979. Era visto como um inovador da sétima arte nos anos 1980.

“Era Uma Vez Um Gênio” não é um estrondo comercial nem um filme feliz. Joga para a atualidade a solidão de um gênio enclausurado diversas vezes em uma garrafa, lamparina ou vidro de perfume por tentar entender o universo feminino ou interferir no mundo das mulheres. Cria-se dó ao assistir à produção, que, como grande estraga-prazeres, digo que termina com final feliz.

Os gênios tiveram vida promissora no ocidente a partir dos anos 1700 quando foram compiladas diversas histórias populares presentes no oriente médio desde os anos 800. Era um folclore riquíssimo que nunca havia sido colocado no papel. Quem contava um conto, colocava um ponto a mais. No dito popular, chegou aos dias de hoje uma conjunção de dramas, comédias, aventuras, romances e tudo mais que no início servia de moral aos costumes sociais. Foi aí que surgem os volumes de “Os contos das mil e uma noites”. Difícil é dizer como Sherazade sobreviveu sendo que os contos chegam a 300 deles o que não daria para completar a quantidade de noites propostas no título.

Muitos contos foram ouvidos na Síria pelo francês Antoine Galland que via nesta história um sucesso maior do que a sociedade europeia consumia nos livros, então um mercado promissor para a imaginação e o entretenimento. A matriz veio do livro Hazār afsāna, ou “Mil contos” no idioma persa. As “Mil e Uma Noites” foi uma coletânea que envolveu árabes, turcos, franceses e sírios.

Galland notou que as veia inspiradora estava se esgotando e incluiu fábulas chinesas como as histórias de gênios. Aladin, portanto, veio da China. No original, o Aladin trazia dois gênios, um preso num anel e outro preso numa lamparina. Gênio vem da palavra jinn (descobriu o porquê da série Jeannie é um Gênio?). Jinns são entidades protetoras presentes em religiões, mas que povoaram o imaginário coletivo como anjos da guarda e realizadores de desejos ocultos. Estiveram na TV e no cinema através da Disney, Hanna-Barbera, Barbara Eden e outros. Eram gênios bons.

É nesta tônica que George Miller envolveu Tilda Swinton e Idris Elba, artistas que formam o elenco principal. Ela, desiludida por um amor não correspondido. Ele, desiludido por ter se dedicado a amores que não geraram frutos e o aprisionaram. Tiraram sua liberdade e o direito de uma vida digna. Um encontra o ombro amigo no outro. Detalham histórias míticas – afinal é um filme de gênios! – envolvendo o expectador até o final.

Crises existenciais fazem deste um filme maduro na carreira de Miller que, nas duas décadas passadas lutou e conseguiu levar pessoas aos cinemas vendo crescer a bilheteria de suas produções, e agora busca seu espaço no mundo do streaming onde determinados filmes podem ser assistidos gratuitamente. Uma fábula do cinema na qual não existe gênio que consiga transpor pessoas nos assentos do cinema e grana no bolso dos produtores. Vale o escapismo.

(Publicado no Jornal de Piracicaba de 14 de maio de 2025 e na Tribuna Piracicabana de 17 de maio de 2025)

quinta-feira, 8 de maio de 2025

Contadores de história

Edson Rontani Júnior, jornalista e cinéfilo 

Versão: seu ponto de vista ou modo de contar o que assimilou sobre determinado conteúdo. Assim Walt Disney fez com “Branca de Neve e os Sete Anões”, de 1937, o primeiro longa-metragem da empresa, feito com tecnologia inovadora à época. Disney adaptou à sua moda a versão clássica de um conto popular. A obra motivou “O Mágico de Oz”, em 1939, pela Warner Bros. Também inovador. Em desenho, carne e osso ou live-action, são versões de contos folclóricos, autorais ou não.

Os Estúdios Disney retornam agora com a franquia das princesas dirigida por Mark Webb a qual teve estreia nacional em março passado. Evite comparações. Assim como os desenhos animados de grande sucesso no passado repaginados como “Rei Leão”, “A Pequena Sereia” ou “Aladim”. O jeito de pensar mudou nas últimas décadas e com isso inovações são necessárias como a inclusão de gêneros sexuais ou empoderamento feminino, ou ainda aversão ao tabaco e a luta na preservação do meio-ambiente.

Branca de Neve era um conto com sua versão original propagada de geração em geração na Europa. Um conto para adultos, aliás. Assim como boa parte dos atuais contos infantis. Você já leu o original de Chapeuzinho Vermelho? Arrepia qualquer um! Já a Branca tem situações aversas à ilusão criada por Disney. Dormia com um dos anões. Não foi salva pelo beijo de um príncipe, que, diga-se, a despertou ocasionalmente quando carregava seu caixão, tropeçando e fazendo, diante da queda, com que ela cuspisse o miolo da maçã que havia comido e entalado em sua garganta.

A nova Branca de Neve da Disney tem pontuações atuais. Branca de Neve sonha em liderar o povo no condado em que vive. Não pregando guerra e sim bondade e generosidade, como fizeram seus pais. O príncipe encantado é trocado por um serviçal do rei que a denuncia quando está roubando mantimentos do castelo real. Os anões também foram adaptados ao politicamente correto contemporâneo: não são anões pois isso geraria apologia ao nanismo. Possuem a mesma altura da Branca de Neve e são descritos como criaturas mágicas com mais de 1/4 de milênio de vida.

As histórias originais nunca foram criadas para acolher corações frágeis. O escapismo é uma alternativa criada pelo cinema como forma de arrecadar bilheteria, através do tal “final feliz”. Contos clássicos foram feitos para assustar os adultos com moral de punição, barbárie social e assim vai.

O cinema prepara a terceira versão Disney – não feita por este estúdio – com tons de horrores. Alladin começa a ser filmado em maio por Charley McDougall. Anteriormente, Ursinho Pooh e Mickey arrepiaram os amantes da sétima arte. Ninguém gostou, claro.

Mas, de onde surgiram essas versões? Os contos da mil e uma noites tem sua origem no Oriente Médio, mas foi somente lá por 1700 que alguém os colheu e publicou numa única produção impressa. Isso graças à prensa criada por Gutenberg lá por volta de 1450. Agora era possível tirar várias cópias de documentos. Era um trabalhão. Mas a matriz era propagada e perpetuada concorrendo com a língua viva.

Foi neste pensamento comercial que surgiram iniciativas como a do francês Antoine Galland que compilou histórias coloquiais árabes como os Contos da Mil e Uma Noites. Não que a cultura árabe detenha o original de certas obras, isso por que na Índia já eram contadas essas histórias, por longos séculos.

Charles Perrault, outro francês, no final do século 1600 teve ideia idêntica e criou o livro “Contos dos tempos passados”, um estrondoso sucesso com Bela Adormecida, O Gato de Botas, Cinderela e outros que caíram no gosto popular.

Já os irmãos Grimm – Jacob e Wilhelm, linguistas alemães, registraram as principais fábulas infantis que conhecemos por livros, revistas ou pelo cinema, utilizando inclusive os originais de Perrault. De originalidade, nenhuma. Colocaram no papel aquilo que era falado no dia a dia, vindo de povos antigos como os indígenas. E, como contaram um conto, acabaram sempre aumentando um ponto. E tire assim, sua melhor versão do que você assimila.

(Publicado no Jornal de Piracicaba de 1º de maio de 2025 e na Tribuna Piracicabana de 10 de maio de 2025)


quinta-feira, 1 de maio de 2025

Prensas

Edson Rontani Júnior, jornalista e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba 

Em busca de homens honestos, Diógenes saía pelas ruas empunhando uma lanterna. O filósofo grego viveu 400 anos antes de Cristo. Perambulava pelas e morava nas ruas. Suas ideias não eram bem aceitas pela sociedade, a qual considerava corrupta. A mesma o condenava ser lelé da cuca por procurar gente honesta, numa crítica aos regimes políticos.

A imprensa local também buscou encontrar os honestos. Porém, um dos jornais tendia no maior estilo non sense já visto em Piracicaba. Um jornal que tinha como redator responsável um tal de King Kong não era bem o que o leitor esperava e muito menos inspirava credibilidade. Mas assim foi o semanário “A Lanterna de Diógenes”, publicado no início dos anos 1930. O responsável era Ângelo Sangirardi, membro por quase duas décadas antes do Instituto Histórico de São Paulo. Este é um dos jornais que guardo a sete chaves, tendo-o recebido de meu pai. Nele estão exemplos esquecidos da grande imprensa, seja pela crítica feroz assim como o jornalismo sem qualquer pretensão informativa.

“A Lanterna” foi um jornal satírico ou como estampava sua capa “órgão de caráter piadístico e espinafrativo”. Sua organização era apresentada por pseudônimos como Conselheiro Espinafre ou o Espadachim das Arcadas. A crítica era ao jeito das pessoas e seus costumes citando nomes irreais mas que lembravam a sociedade como Sebastião Solene (para Sebastião Nogueira de Lima, delegado), Lauro Capilé (para Lauro Catulé de Almeida, professor e vereador), entre outros.

À época, a sociedade não entendia bem esse mise-en-cène das prensas locais. Mas a coisa pegou como sátira numa época de repressão pela Revolução de 1930 e logo em seguida pela censura imposta na Revolução Constitucionalista. Isso se torna evidente pois desfilavam pelas páginas da “Lanterna” patrocínios de empresa renomadas como A Porta Larga, Casa Pernambucanas, macarrão Aurora, Gatti Relojoaria e os advogados Jacob Diehl Netto e Moacir Amaral dos Santos (ministro do STF).

O estilo ácido e irônico era seguido através dos AlMANHAques (A Manha era uma corruptela do jornal A Manhã) do Barão de Itararé, o jornalista Apparício de Torelly que possuía uma tremenda criatividade numa época em que as prensas ainda viviam da linotipia e somente muitos anos depois renderam-se ao past-up. Um humor que nos anos 1980 foi sugado pela TV Pirata na Rede Globo e pelos jornais Casseta Popular e Diário Planeta, que se fundiram e na TV renderam o Casseta Planeta.

Mas as prensas locais tiveram muitos expoentes que são esquecidos dos estudos acadêmicos. Um destes foi João Gomes de Escobar que montou uma tipografia (Popular) na cidade na segunda metade do século 1800. Foi ele o autor do segundo jornal publicado na cidade intitulado “O Piracicaba” cuja primeira edição circulou em 1° e março de 1876. Ao contrário de “A Lanterna”, as produções de Escobar eram bem mais sérias. Ela professor e poeta e “agitador” social com ideias avançadas. “Palavras de Deus” foi outro jornal sob sua responsabilidade, servindo de porta voz para os protestantes locais. Também dirigiu “A Democracia” (1878), um libelo contra a monarquia e foi redator de “A Alvorada” (1880) com críticas à sociedade de então. 

Décadas depois, mais precisamente nos anos 1970 tivemos a revista Aldeia que, de forma suave, pretendia ser o Pasquim da terrinha. Muito bem feito e conduzido, merecedor de um destaque futuro. Com vida curta mas com marcas deixadas, O Jornal do Povo Piracicabano também contestava a sociedade e a política. Deixou uma história que nos faz repensar e reestudar as prensas locais.

(Publicado no Jornal de Piracicaba de 27 de abril de 2025 e na Tribuna Piracicabana de 3 de maio de 2025)