Edson Rontani Júnior – jornalista e presidente do
Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba
A
idade chega. A coluna começa a reclamar. A necessidade de inovação se torna um
desafio. Mas, o riso ... este nunca esmorece. E nosso ícone nacional chega à
sua edição de número 50, em ritmo de festa, pois o Salão Internacional de Humor
merece louros e elogios por ser um dos mais longevos deste país, passando por
décadas nas quais tivemos mudanças e convulsões sociais, políticas, econômicas
... enfim, situações vistas coo prato cheio para aqueles que através do traço
desenham o avançar da vida, seja no país ou no globo.
Sua
história é notória e não me compete aqui relembrar de relance tudo o que
ocorreu no passado, mas cito que convivi e conheci alguns dos criadores deste
ícone, como Alceu Marozzi de Righetto, Adolpho Françoso Queiroz, Cerinha,
Fausto Longo, Fagundinho e tantos outros. Fui pupilo de Adolpho na graduação em
comunicação social quando este coordenava a área de jornalismo na Unimep.
Sempre estive ao lado de Righetto nas décadas de 1980 e 90 por força
profissional e pessoal. Uma pessoa irrequieta, contestadora, que muito me
ensinou sobre o lado crítico da vida. Citar nomes é uma forma de cometer
lapsos. Sabemos que o time de criadores, defensores ou expositores do humor é
grande, mas a lembrança muitas vezes nos prega peças.
Assim
como compete lembrar da geração atual que, quando o Salão brotava, nem nascida
era ou ainda estava na tenra infância, como Baptistão, Spadotto, Grosso,
Paffaro, Hussar, Boligan etc etc etc ... De novo, cometo a falta de ética de
citar nomes de extensas listas. Teve também o pessoal dos bastidores, aqueles
que “carregam o piano” ou abrem e fecham as cortinas. Afinal, meio século de
vida merece muito mais que uma determinada quantidade de toques neste matutino.
O
Salão de Piracicaba buscava ser uma forma de escapismo à mordaça da censura
existente na época. O Brasil vinha de Atos Institucionais que tiraram a voz da
população, reprimenda que deixou manchada de sangue nossa história. Se
buscarmos o humor na segunda meta dos anos 1960, tínhamos nas bancas de
jornais, reproduções de charges norte-americanas, as chamadas “piadas de salão”
ou “piadas de papagaio”, algo chato para os dias de hoje com humor lusófonos ou
contados da boca de um papagaio. Surge “O Pasquim” como porta-voz de muitos
brasileiros, inclusive os piracicabanos que por aqui fizeram uma versão
pamonhesca chamada de “Aldeia”, nome para relatar aquilo que passava por nossa
“tribo”. O que não era possível se falar através de artigos ou matérias
jornalísticas era retratado através dos traços com dúbias interpretações. Me
lembro que charge mostrava um pássaro ressabiado numa gaiola com a porta
aberta. Estava chegando o fim a censura. Mas, o pássaro relutava em sair da
gaiola. O que o esperava lá fora ? Interpretações a parte ... Oras ! Era apenas
um pássaro numa gaiola que agora tinha liberdade. Ou, convenhamos... quando
Chico Buarque de Hollanda cantava o seu “Cálice, de vinho tinto de sangue” ele
estava segurando uma taça na mão ou afastando uma mordaça que na boca o impedia
de falar ?!?
O
Salão de Humor passou por vários locais até que o Teatro Municipal foi aberto e
lá reuniu gente dentro e fora de seu hall. As noites de abertura eram
concorridas. Expandiu-se para outras paredes com suas exposições paralelas.
Umas das exposições que visitei ocorreram na Pinacoteca Municipal. Sim no
espaço de exposições da alta classe como a Arte Contemporânea e Belas Artes,
salões também tradicionais da cidade.
Em
11 de agosto de 1974, “O Estadão” trouxe artigo de meia página escrito e ilustrada
por Zélio Alves Pinto, fazendo um paralelo da primeira caricatura publicada no
Brasil, num livro editado em 1837 e a criação do Salão de Piracicaba.
Quem
viveu os anos 1970 tem em mente outra publicação alternativa chamada MAD,
inicialmente publicada pela Vecchi Editora. Entre vários expoentes de então,
Sergio Aragones era um nome forte tanto na MAD americana quanto nacional. Ei-lo
em Piracicaba em 21 de agosto de 1976, noticiado também pelo “Estadão”. O
mexicano que completava 12 anos de atuação nos desenhos desembarcava em terras
piracicabanas para dar um ar internacional no Salão. Aliás, Internacional nosso
salão só viraria em 1979 quando a edição daquele ano foi realizada de 18 de
agosto a 3 de setembro no Teatro Municipal. Cem trabalhos de 800 inscritos
fariam a primeira retrospectiva dos seus cinco primeiros anos de vida.
O
acervo do “Estadão” é rico quando o assunto é Salão de Humor. Tanto que em sua
edição de 24 de agosto de 1978, o general João Figueiredo, cotado para ser o
próximo presidente da República (Ernesto Geisel era o mandante então), comenta
em entrevista, o pronunciamento feito por Henfil durante o Salão de Piracicaba
sobre uma possível exposição pública de sua personalidade como forma de tornar sustentável
a abertura política no jargão entoado na época pelos brasileiro : “ampla, geral
e irrestrita” ...
Assim
sendo, a exemplo de uma das mais clássicas artes expostas neste Salão
Internacional, feita por Laerte parodiando conto de Hans Christian Andersen, o
rei não está nu. Está em traje de gala para comemorar este meio centenário de
vida.
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